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Mensagens

O pássaro do Brasil

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Fazer observações

- Ouvi, certa vez, falar de um homem - disse ele - que se tinha erguido no céu num balão para fazer observações; um homem de grande encanto pessoal mas com queda para a leitura de livros. Foram-lhe dando corda, até ter desaparecido por completo de todas as vistas, com ou sem telescópio, e depois deram-lhe mais dezasseis quilómetros de corda para terem a certeza de que as suas observações eram de grande categoria. Quando o limite de tempo para as observações terminou, voltaram a puxar o balão, mas eis que não existia homem algum no saco e o seu cadáver nunca foi encontrado, jazendo vivo ou morto em qualquer freguesia. (...) - Mas tiveram a inteligência de voltar a enviar o balão, passados quinze dias, e, quando o puxaram de novo, eis que o homem estava sentado dentro do cesto, sem um fio de cabelo fora do lugar, se é que posso acreditar nas minhas informações. Flann O'Brien, O terceiro polícia . Tradução de Rita Carvalho e Guerra.

Óculos sujos e embaciados

O que é pior do que um calo no pé? Eu respondo: óculos sujos e embaciados. Pode correr-se o universo inteiro que não se encontrará coisa pior. Quando os óculos se acham sujos e embaciados, os homens, o mundo, os homens, enfim, o mundo, surgem sob um ângulo inteiramente novo, muito mais autêntico, muito mais verdadeiro. Os óculos sujos e embaciados apresentam a vida na sua mais repugnante vividez. É a verdade das coisas, aguda e penetrante, que se revela em toda a sua amplitude, até aos mais ínfimos pormenores. Ora, nem eu – irremediável caixa de óculos – nem ninguém se agrada destas tristes extravagâncias. Ver as coisas tal como elas são não é uma brincadeira. Ver as coisas tal como elas são é uma tortura insuportável. Esta é a razão pela qual todas as pessoas que usam óculos se esforçam por mantê-los com as lentes muito bem limpas. Assim, tudo continua no seu devido lugar. E continua muito bem. Publicado no Porto24, página dos "Cronistas do Bairro".

Assaltaram bar e tomaram pequeno-almoço com objetos furtados

O furto ocorreu na Rua Infante D. Henrique, uma das mais movimentadas e centrais da cidade, no Bar Tertúlia, às 4.56 horas, cerca de hora e meia após o enceramento. Os dois homens, um jovem e um outro elemento de 64 anos, emigrante em França, usaram pedras da calçada para partirem vários vidros da montra. Já no interior e depois de se terem cortado no vidro que partiram apoderaram-se de bebidas e aparelhagem de som. (…) Na pose dos objetos furtados, o duo de assaltantes foi tomar o pequeno-almoço a uma padaria da cidade. Encostaram a mesa de mistura e a garrafa de gin que exibiam sinais de sangue a um canto daquele estabelecimento de restauração. Jornal de Notícias, 2 de Dezembro de 2015.

Uma edição da Língua Morta

Uma edição da Língua Morta . Pedidos para a Língua Morta, através de edlinguamorta@gmail.com. Também disponível nas livrarias indicadas aqui .

Pela poeira que se levanta ao longe

Da investigação de E. Soja, imagino algures no chamado Crescente Fértil - hoje a ferro e fogo, do Estado de Israel ao Estado Islâmico –, um grupo com o seu chefe no cimo de uma colina. Diz um: – pelo pó que ali se levanta ao longe, vem aí um grupo com o seu rebanho! – sim, diz outro, espécie de chefe, vamos matá-los todos e as suas cabras e reservas de alimentos serão para nós um “excedente” de quem dele já não precisa. Assim fizeram e foi uma chacina. Dali a tempos, repete-se a cena. Diz um: – pela poeira que se levanta ao longe, vem aí um grupo com o seu rebanho! – sim, diz o tal chefe, agora todo-poderoso pelo sucesso que teve na operação militar anterior; agora não vamos repetir a asneira da outra vez: matamos metade e escravizamos os outros para trabalharem, pastorearem o rebanho e agricultarem estas terras aqui à volta da colina. Tantas vezes isto ocorreu, que o pessoal nómada que por ali deambulava com os seus rebanhos começou a passar palavra de umas tribos para outras dizen

Prosa n.º 161

Tenho o hábito de atirar as beatas pela varanda, em plena Place Falguière, quando estou apoiado nela e não passa ninguém na rua. Por isso irrita-me ver alguém ali parado quando me preparo para fazer este gesto. Que raio faz esse tipo metido no meu cinzeiro?, pergunto-me. Julio Ramón Ribeyro, P rosas Apátridas . Tradução de Tiago Szabo. Amanhã, sábado, 21 de Novembro, pelas 17h00, no Gato Vadio.

Fake books

When Charles Dickens moved into Tavistock House in 1851, he decided to fill two spaces in his new study with bookcases containing fake books, the witty titles of which he had invented. And so, on October 22nd, he wrote to a bookbinder named Thomas Robert Eeles and supplied him with the following "list of imitation book-backs" to be produced. History of a Short Chancery Suit Catalogue of Statues of the Duke of Wellington Five Minutes in China. 3 vols. Forty Winks at the Pyramids. 2 vols. Abernethy on the Constitution. 2 vols. Mr. Green's Overland Mail. 2 vols. Captain Cook's Life of Savage. 2 vols. A Carpenter's Bench of Bishops. 2 vols. Toot's Universal Letter-Writer. 2 vols. Orson's Art of Etiquette. Downeaster's Complete Calculator. History of the Middling Ages. 6 vols. Jonah's Account of the Whale. Captain Parry's Virtues of Cold Tar. Kant's Ancient Humbugs. 10 vols. Bowwowdom. A Poem. The Quarrelly Review. 4 vols. The

Prosa n.º 35

As palavras que dizem os amantes durante o seu primeiro orgasmo são as que no futuro presidirão a toda a sua comunicação sexual. São momentos de absoluto improviso, em que os amantes se rebaptizam ou rebaptizam as partes do seu corpo. Os novos nomes hão-de regressar sempre durante o acto para instituir o código que utilizarão na cama. Estas palavras são inocentes e muitas vezes metafóricas em relação ao que significam. Às vezes são também disparatadas. Ninguém está livre de dizer à sua mulher na primeira noite em que a toma: "alcachofra." E mete-se em apuros porque a partir daí, ao tomá-la, terá sempre de lhe dizer "alcachofra". No dia em que não o disser, terá deixado de a amar. Julio Ramón Ribeyro, P rosas Apátridas . Tradução de Tiago Szabo. Próximo sábado, 21 de Novembro, pelas 17h00, no Gato Vadio.

Próximo sábado, 21 de Novembro, pelas 17h00

No próximo sábado, 21 de Novembro, pelas 17h00, as Leituras do Gato Vadio serão dedicadas ao autor peruano Julio Ramón Ribeyro e ao seu fabuloso livro "Prosas Apátridas". O convidado é o Paulo Vasques. A imagem da leitura é de Luís Nobre, da dupla Lina&Nando .

O que pode acontecer

Tudo, absolutamente tudo, pode acontecer. Nicolas Segerstam pode estar a lavrar a terra e, nisto, descobrir por entre raízes de rododendros uma brilhante pepita de ouro. Amargurado, Krieger pode torcer as mãos a tal ponto que do meio delas salte – zás! – um gato preto. Dois enormes ursos, firmemente erguidos sobre as patas traseiras, podem achar-se a tomar café e a devorar bolos de arroz ao balcão do Café Ceuta. Um cigarro pode estar a fumar um homem, neste preciso momento, sob o guarda-sol de uma esplanada. O bico de um melro pode transformar-se numa flor amarela. Ou uma flor amarela ganhar asas escuras como as de um melro. Jugha Kangas pode desaparecer do seu amplo, luminoso e confortável gabinete ministerial, de repente e sem deixar rasto, como alguém que se tivesse dissolvido no ar. Uma mosca delicada pode queimar as patinhas – ai! – ao pousar no traseiro suave e desnudo de Cornélia Kallisch. Enfim, tudo, absolutamente tudo, pode acontecer. Mas, normalmente, não acontece nada. P

Fronteiras

Las fronteras entre los llamados géneros literarios son frágiles y catalogar sus textos en uno u otro género es a menudo un asunto circunstancial, pues toda obra literaria es en realidad un continuum. Lo importante no es ser cuentista, novelista, ensayista o dramaturgo, sino simplemente ser escritor. Julio Ramón Ribeyro.

A poesia é quem cria o leitor

Há sempre uma violência contida no gesto de antologizar. Porém, tal violência se torna necessária quando há a necessidade de responder a uma exigência, qual seja: não há, a priori, um leitor de poesia: a poesia é quem cria o leitor. O gesto da antologia é muito semelhante ao da tradução: antologizar não seria uma forma de traduzir? Aqui.