Avançar para o conteúdo principal

Quarteto de cordas (no meio do Atlântico)

Escrevi um texto para os Encontros de Cinema do Fundão em que me aproximo dos filmes de Huillet, Straub, Godard e Costa através da música. Os textos que escrevo não são términos, ficam sempre a meio do caminho para outra coisa; e agora que ando a ler o livro de Jacques Rancière sobre (os quartos de) Pedro Costa, principalmente nas conversas com Cyril Neyrat, percebi que mais do que leviandade ou teimosia, o meu gesto tinha um desígnio escondido. 

Na verdade, fiz o que fiz também para evitar um olhar demasiado preso às imagens e significados. Pedro Costa é bom, é mesmo muito bom, a construir imagens simultaneamente perturbadoras e belas e eu queria libertar um pouco os seus filmes de tanta interpretação estética. Porque nós somos assim: mal vemos uma imagem, parecemos polícias ou psicanalistas, levantamos um inquérito e queremos saber o que é que ela significa. As garrafas verdes cheias de pó junto à janela passam a ser una natureza morta (ou um plano-almofada?) que é preciso dissecar.

Mas a música? Ah, a música desliga essa parte chata e inquisitiva da nossa cabeça e faz de nós o que quer. (A música é a arte mais estouvada e por isso a mais doce. Os intelectuais nunca a apreciarão, mas são os que mais profundamente beneficiam quando a ouvem). Deixamo-nos ir, esquecemo-nos da semiótica e com sorte até nos esquecemos de quem é o autor. Estamos dentro do filme como no meio do Alântico.


Comentários