Sessão de solidariedade com o povo palestiniano. A livraria está cheia. Alguém lê um poema: «… os meus dias estão salpicados de sangue e de perdas irreparáveis…» Um tipo, sentado à minha frente, fotografa com o telemóvel as suas pomposas sapatilhas amarelas. Faz várias imagens, de diferentes ângulos. A leitura prossegue: «… o fogo rodeia-me por todos os lados…» O tipo escolhe uma fotografia e exibe, orgulhoso, as sapatilhas amarelas nas redes sociais. Espera cinco segundos pelos primeiros likes. Reage com um emoji sorridente a um comentário. Ao lado, encostada à parede, uma rapariga de 18 ou 19 anos, escuta o poema abraçada a um boneco de peluche que trouxe de casa. «… nem mesmo aos meus inimigos fidagais desejo este inferno…» Um rapaz também quer ler um poema. Pousa o gin-tónico, compõe o gesto e começa. Não há dúvida de que sabe ler. Talvez seja um actor. «… os nossos ossos hão-de ser Inverno para queimar à lareira…» A amiga dele grava tudo com o telemóvel. Aplausos, aplausos. O rapaz agradece e beberica mais um pouco de gin.
de Cristina Fernandes e Rui Manuel Amaral
Comentários
Anunciaria a cura para todos os males, a paz perpétua.
Nem Trump almejou tanto.