Começa a fazer-se tarde. A festa está no auge. Os alegres companheiros são todos cor, barulho, amor. As lindas raparigas, desapertadas, descompostas, abandonam-se. Os seus olhos entrecerram-se docemente, e os seus lábios que se entreabrem deixam aperceber tesouros húmidos de púrpura e de nácar. As taças, nunca cheias e nunca vazias! Esvoaçam no ar as canções, ritmadas pelo tilintar dos copos e pelas casquinadas de riso das lindas raparigas. De súbito, o velho relógio da sala de jantar interrompe o seu tiquetaque monótono e resmungão para ranger raivosamente, como faz sempre quando lhe dá para bater as horas. É meia-noite. As doze badaladas caem, lentas, graves, com aquele ar de ralho próprio dos velhos relógios patrimoniais. Parecem dizer-nos que já muitas badaladas deram eles para os nossos avoengos desaparecidos e que ainda muitas mais darão para os nossos netos, quando nós já não estivermos cá. Sem se aperceber, a nossa alegre companhia pôs uma surdina à sua balbúrdia e as
de Cristina Fernandes e Rui Manuel Amaral