— É paradoxal que as melhores adaptações de Dostoiévski sejam de Bresson: um é eufórico e o outro refreado. — Não basta não gostar das Noites Brancas, de Visconti, para determinar esta certeza. — Quando escrevo “melhores adaptações” quero dizer: as que vão directas ao âmago. Quando escrevo "âmago", quero dizer: coração. — Mas, para além desse disparo certeiro, Bresson transforma as histórias de Dostoiévski em objectos austeros ou, como diria um cinéfilo praticante, justas . — Insolente. — Em termos estéticos, troca Dionísio por Apolo. — Em termos corriqueiros, retira toda a doença a Dostoiévski ou melhor: substitui a epilepsia por uma neurose contemplativa. — Resulta tão bem no cinema. — Mas é revigorante voltar a Dostoiévski e encontrar a exaltação e seres humanos mais imperfeitos.
de Cristina Fernandes e Rui Manuel Amaral