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Uma novidade desastrosa

Todo o dia ruminei sobre um pequeno detalhe extraordinário. Quando Pascal fala do homem, diz: que caos, que contradições, etc. O homem, que novidade ! Esta «novidade», que palavra admirável para definir o carácter anormal da aparição do homem, o imprevisto e o desconcertante de tal fenómeno. Com efeito, o homem é, na natureza, uma novidade, uma novidade desastrosa. Emil Cioran, Cadernos 1957-1972.

Ervilha debaixo do colchão

Também podia abrir um Gabinete de Investigações Literárias  — na verdade não me faltam ideias para negócios sem prosperidade. Mal comecei a ler Geada , de Thomas Bernhard, fiquei logo com vontade de descobrir qual é o livro de Henry James que o jovem estagiário de medicina levou para Weng. Em vez do livro de Koltz sobre as doenças do cérebro, mais apropriado às circunstâncias da sua missão, ele preferiu Henry James — porquê? E trata-se mesmo de uma decisão sua, enquanto personagem e narrador, ou é uma partida de Bernhard? Sobre o Pascal do pintor Strauch não tenho dúvidas, é um livro qualquer, quer dizer, todos. Além disso é possessivo: é o Pascal do pintor Strauch .  Agora o Henry James não me sai da cabeça. Às vezes acho que é “A fera na selva”, a seguir percebo que só pode ser “O desenho no tapete”, depois volto à estaca zero: nem fera nem desenho, é outra coisa.

Pensamentos de dupla face

L'homme n'est qu'un roseau, le plus faible de la nature, mais c'est un roseau pensant.  A frase de Pascal é tão boa que se pode ler nos dois sentidos; conforme o filósofo a escreveu, mas também na direção inversa, considerando a condição pensante do homem como axioma, e ser junco como vontade.  Podia ser um dos segredos da escrita — ou até mesmo da vida — de Walser.
Este excelente Chanturgue, sem dúvida que Pascal o deve ter bebido, já que era de Clermont. O que lhe critico não é ter-se privado dele — sou a favor da privação, do ascetismo, da Quaresma, sou contra a abolição da Quaresma —, é não lhe ter prestado atenção quando o bebia. Como estava doente, seguia um regime e só comia coisas boas, mas nunca se lembrava do que tinha comido. — Sim, é a sua irmã Gilberte que conta isso. Ele nunca disse: "Isto está mesmo bom!” — Pois bem, eu digo: isto está mesmo bom! E não reconhecer o que está bom é um mal, falando cristãmente. Eu digo que é um mal.

Paciência revolucionária

Em Exercícios de Admiração , no texto dedicado a Joseph de Maistre ( ensaio sobre o pensamento reacionário ), Cioran termina um parágrafo assim (com parêntesis e tudo):  (Consegue-se imaginar uma revolução a sacar slogans de Pascal?) É uma boa pergunta. Se lermos devagar, percebemos que é mais do que isso; Cioran propõe um revigorante exercício intelectual. Pode-se praticar em casa — em casa de Maud, por exemplo.

Coisas abstratas

O que Wittgenstein escreve sobre Pascal e os números é uma espécie de superfície espelhada; do outro lado vemos Wittgenstein e as palavras. O mesmo êxtase perante as “admiráveis propriedades” das coisas abstratas.

Faltou-nos jogo interior

A ideia já andava na cabeça há algum tempo, mas foi preciso ler a frase “faltou-nos jogo interior” no rodapé da televisão sem som para conseguir agarrá-la: Fernando Santos é um treinador completamente bressoniano. Quer converter os jogadores profissionais em modelos ; sonha transformar o futebol em puro  movimento interior . Os jogos da seleção deviam ser filmados em longos planos geométricos (vertente Pascal) e transmitidos a preto e branco — uma celebração.