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Uma certa alegria enterrada

Uma das piores coisas que podem fazer aos filmes de Huillet e Straub é cortar-lhes o diálogo, apresentá-los como obras cinematográficas desgarradas ou, pior ainda, como  objectos artísticos . Esse isolamento não é mais do que um caminho de redução, esquecimento e morte. Pela minha parte, faço tudo o que posso para os aproximar do ar livre, dos outros, dos meus pequenos gestos diários (ajudam-me tanto a ver a ouvir e a descobrir no fundo de tudo uma certa  alegria   enterrada ). No sábado levei Karl Rossmann ao Nimas para falar de O sangue .  Amanhã, levo o método de Trop tôt, trop tard para encostar a D’est,  de Chantal Akerman .

Advertência

Podendo, de bom grado se teria passado sem tanta mitologia. Mas estamos convencidos de que o mito é uma linguagem, um meio de expressão — quero dizer, não uma coisa arbitrária mas antes um viveiro de símbolos a que pertence, tal como a todas as linguagens, uma particular substância de significado que mais nada poderia dar. Quando repetimos um nome próprio, um gesto, um prodígio mítico, exprimimos em meia linha, em poucas sílabas, um facto sintético e compreensivo, um miolo de realidade que vivifica e alimenta todo um organismo de paixão, de estado humano, todo um conjunto conceptual. Se depois este nome, este gesto nos for familiar desde a infância, desde a escola — tanto melhor. A inquietude é mais verdadeira e cortante quando agita uma matéria costumeira. Aqui contentámo-nos em servir-nos de mitos helénicos dada a perdoável voga popular destes mitos, dada a sua imediata e tradicional aceitabilidade. Temos horror de tudo o que é incompleto, heteróclito, acidental, e tentamos — até mat

Falam com grande gravidade e, apenas, o estritamente necessário.

João César Monteiro: Os diálogos que escreveste para o Mudar de Vida do Paulo Rocha também são resultantes de uma investigação prévia? António Reis: Nesse caso, a natureza dos diálogos deve-se primeiro, a um espírito muito conciso que tenho na poesia: o seu aspecto descarnado é também peculiar à região dos vareiros da Afurada, que eu conhecia. Havia uma certa afinidade com a maneira de falar da região porque eles falam com grande gravidade e, apenas, o estritamente necessário. Para além disso, o Paulo Rocha ia tratar um tema que eu estudara na adolescência, e isso foi determinante. Praticamente, vi sempre o diálogo na boca das pessoas. Por isso, tem muitos silêncios, muitos  staccatos , uma pontuação cinematográfica. Na verdade, julgo que criei um diálogo para cinema. Com esta sorte também: é que, na expressão poética eu era muito económico e conhecedor dos vícios em que se incorreu ao utilizar o diálogo como suporte de muitos filmes e estava, por assim dizer, alertado contra esse