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Luta de classes

Nas ruas, os remediados arrancam os olhos aos pobres. Os pobres quebram as pernas aos miseráveis. Os miseráveis atiram pedras aos moribundos. Nos estúdios de televisão, os comentadores comentam. Nos camarotes, os ricos assistem a tudo, em roupa de gala, e batem palmas. Palminhas elegantes e discretas. Um tilintar simpático de pedras preciosas.

Revolução de inércia

O maior erro histórico é um erro de perspectiva — nos vários sentidos da palavra.  Desde a revolução francesa que os pobres deviam comer brioches , isto é, largar a pele de pobre, os olhos de pobre. E nem era preciso uma guerra, bastava não fazer nada, ficar parado.  Sonho com uma revolução de inércia.

Como se morre

Os relatos de Como se Morre , de Émile Zola são impressionantes pela forma como a proximidade e consumação da morte são descritos sem sentimentalismos nem uma palavra a mais. Pode-se, talvez, falar de uma escrita tendencialmente crua, limpa, realista, qualquer coisa desse género. É um trabalho exemplar que sabe ainda melhor dada a alarvice que por aí circula. Apesar de ter aderido logo ao espírito da obra, aos poucos comecei a perceber que Zola incorria noutro erro, mas já lá vamos, agora passo a palavra a V.S.T. que explica bem o caso na sua nota introdutória Zola porque sim : «Aqui temos, rapaziada, e em curtas páginas, Zola no seu melhor-do-costume — cinco-narrativas-cinco onde, com precisão de antropólogo social e numa prosa particularmente eficaz no desenho de personagens, situações e ambientes (em meia dúzia de parágrafos, eis descrito o universo das diferentes classes — da aristocracia altaneira ao proletariado miserável e ao campesinato, passando pelas burguesias gorda

O evento

Tudo começou em 2017, quando Douglas Rushkoff - um professor de teoria dos media e de economia digital, e um dos 10 mais influentes intelectuais da atualidade segundo o MIT - foi convidado, com um tentador honorário equivalente a meio ano de salário, a proferir uma conferência sobre o futuro da tecnologia numa luxuosa e isolada estância. Para surpresa de DR, o público era constituído por apenas 5 grandes investidores de capital de risco, que cercaram o orador com temas fora da agenda do convite. As perguntas prendiam-se com a sua sobrevivência pessoal depois do "evento", o nome dado ao colapso da civilização por causas ambientais, nucleares, tecnológicas, pandémicas, ou pela combinação de todas elas: Qual o melhor sítio para construir um bunker, Alasca ou Nova Zelândia? Como garantir a fidelidade dos guarda-costas, depois do evento? Como impedir as multidões enlouquecidas pelo desespero de assaltarem esses redutos pós-apocalípticos? Viriato Soromenho-Marques.  Texto completo

Ihr habet allezeit Arme bei euch

Na Paixão Segundo São Mateus há uma cena em que os discípulos ficam indignados por uma mulher derramar bálsamos valiosos sobre a cabeça de Jesus. Alegam que é um desperdício; podiam vendê-los e dar o dinheiro aos pobres. Jesus defende a mulher e diz: Ihr habet allezeit Arme bei euch, mich aber habt ihr nicht allezeit (pode traduzir-se assim: tereis sempre os pobres, mas a mim nem sempre me tereis). Parei aqui porque me pareceu que esta intervenção mostrava um traço de orgulho (é para estes atalhos que nos empurram as leituras de Cioran). Mas passado um bocado começou a emergir outra revelação, talvez até mais perigosa. Na primeira parte da frase, nessa imagem de uma pobreza perpétua ( allezeit , que se pode traduzir por “sempre”, é a justaposição das palavras “todo” e “tempo”), percebi que no fundo, no fundo do fundo se for preciso forçar o afastamento, este Jesus é um céptico.