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A mostrar mensagens com a etiqueta Barbara Pym

Às vezes, por mero acaso,

estabelecemos relações entre duas coisas que não têm nada ou apenas pouco a ver uma com a outra. A fotografia de Martin Parr misturou-se com a leitura de “A doce pomba morreu” sem eu dar conta e, mesmo não acreditando no diálogo entre os dois, comecei a ver as antiguidades de Humphrey, o chiffon e outros tecidos vaporosos de Leonora, os casacos de tweed de James, as paredes forradas a papel, com as cores saturadas de Parr. (A palavra javardice aplica-se aqui na perfeição, mas claro que é preferível dizer “contaminação”.) De qualquer das formas, para aliviar a intensidade das cores, hoje de manhã resolvi comprar frésias e camélias e dispô-las numa jarra antiga. Sigo para o “Quarteto no outono”. Por este andar vou acabar a fazer bolos às camadas.

Uma hora na vida de uma mulher

Notas para mais tarde (ainda sobre “Mulheres Excelentes”, antes da devolução do livro): voltar à cena do coelho branco (duas vezes: na página 151 com Everard e na página 241 atirado para os braços de Rocky) E isto (com a etiqueta “crítica literária enviesada”, páginas 166 e 167): “Comecei pela minha própria cozinha onde as coisas do almoço e do chá foram rapidamente lavadas e enxugadas, e depois desci à casa dos Napiers com o intuito de pôr alguma ordem na confusão que lá havia. Nunca se construiu um lava-louça suficientemente levantado para alguém razoavelmente alto e não tardei a sentir dores de costas por causa do esforço de lavagem, sobretudo porque houve que esfregar aturadamente os pratos gordurosos da véspera para que ficassem limpos. Os meus pensamentos não me davam descanso e veio-me ao espírito que, se alguma vez escrevesse um romance, seria do género “fluxo de consciência” e trataria de uma hora na vida de uma mulher ao lava-louça.”

Coisas fora de moda

"Quarteto no outono” e “A doce pomba morreu” estão guardados em depósito . Faz sentido, sentido pymiano quero eu dizer. Como não tinha tempo para perceber se, mesmo assim, os posso trazer para casa, requisitei “Uma rapariga no inverno". É sobre uma bibliotecária. Sinto-me no centro de um conluio — não tarda começa a nevar.

Em 1963

Barbara Pym escreveu e publicou seis romances entre 1950 e 1961. Dois anos depois, Jonathan Cape argumentou que as vendas não cobriam as despesas de impressão e recusou editar "An Unsuitable Attachment". Mesmo que o romance fosse mais fraco, soa a má desculpa. Na verdade o que Cape não teve coragem para dizer é que as personagens de Pym parecem desadequadas aos anos sessenta, são “pessoas comuns com expectativas realistas. Não são pessoas atraentes ou bafejadas pela sorte e nada fazem de grandioso nas suas vidas", como escreve Joana Graça, aqui . Então, enquanto Barbara Pym se retirava para um exílio literário em Oxfordshire, Philip Larkin — que se correspondia com a escritora e se esforçou pelo reconhecimento tardio da sua obra —, marcava 1963 como: annus mirabilis; o ano em que começou a haver sexo; entre o fim da proibição do Amante de Lady Chatterley; e o primeiro LP dos Beatles; a vida nunca foi tão boa como em 1963; oh yeah, oh yeah ; (embora tarde demais par

O castanho faz coisas más a pessoas acima dos trinta

Na página 105 de “Mulheres exemplares”, Mildred Lathbury diz a si mesma “no fim de contas, é assim que a vida é para a maioria de nós: os pequenos aborrecimentos em vez das grandes tragédias; as pequenas aspirações inúteis em vez das grandes rejeições e dos amores dramáticos da história ou ficção.” “Os pequenos aborrecimentos em vez das grandes tragédias” — basta este bocado para construir uma tese, literária ou de qualquer outra espécie. Nada contra. No entanto, se tivesse de escolher uma frase, descia uns parágrafos: — Não sei bem se está será a tua cor — disse eu, duvidosa. — Cheguei à conclusão de que devemos evitar o castanho. Faz coisas más a pessoas acima dos trinta, a menos que sejam muito inteligentes. Quando o meu casaco castanho se gastar, vou arranjar um preto ou azul-marinho. Esta observação de Mildred tem tudo para me agradar: a dúvida, as cores dos casacos, um itálico malandro, até os travessões.

Gin e sandes de pepino

Ainda estou nas primeiras páginas mas já percebi que vou aprender muito sobre a palavra “excelentes”. Barbara Pym consegue virá-la do avesso com imensa piada. Também a palavra “adequados” ganha um novo sentido — servem, adequados têm de servir sempre, não é? — mas apertam como sapatos novos. Claro que o livro não é apenas uma questão de palavras em expansão, “Mulheres excelentes” tem expressões magníficas como esta: — Olá! A sua cara parece uma semana de chuva em Blackpool. Para além disto tudo — e, repito, estou apenas no início —, o tom é  tão   extremamente  britânico que parece que estou a ler em inglês. Às vez cheira a gin e a sandes de pepino.