Sempre pensei que nenhum escritor pudesse usar o método (exuberante? exagerado?) de Thomas Bernhard. O que ele faz com as palavras é tão difícil e extraordinário que sempre pensei que ninguém se atreveria e seguir esse caminho tortuoso. Além disso, a torrente musical do seu discurso ininterrupto não é bem da escrita que emerge e só um escritor que não seja escritor, ou melhor, só um escritor que lute contra a escrita e contra tudo, só um verdadeiro Nestbeschmutzer (não devia ser Nestzerstörer ?) consegue lá chegar. Foi por isso com muita estranheza que encontrei vestígios do tom bernhardiano em «Pudor e Dignidade». Dag Solstad até consegue estabelecer uma relação interessante com O Pato Selvagem de Ibsen. Quando, a meio de uma vulgar aula de literatura a uma turma do secundário, Elias Rukla descobre a importância e o verdadeiro papel do médico Relling, está longe de se aperceber que ele próprio é uma personagem secundária e está no centro de um livro sobre uma personagem secundária. ...
de Cristina Fernandes e Rui Manuel Amaral