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Dos jornais VII

 

Depredação

Em Os Favoritos da Lua , de Otar Iosseliani, há um quadro que é roubado várias vezes ao longo do filme. Sempre que um novo ladrão palma o retrato, a tela é cortada à pressa da moldura, perdendo mais um bocado da imagem. No final, o quadro está reduzido a metade. Quem não tenha conhecido o original, vê apenas a parte que resta, tomando-a pela imagem toda. Uma ideia engenhosa para ilustrar a depredação causada pelo tempo e pelos homens. Sobretudo pelos homens. Por exemplo, a depredação do estado social. Dos direitos laborais. Da democracia. Isto é mais uma achega a propósito do que a Cristina escreveu aqui .
Otar Iosseliani, Aprili , 1961.

They banned the films

In the end, I always managed to do everything I wanted in the Soviet Union, even if my films were banned (...). By the same token, if you were banned, you were someone who was respected. (...) During that time, 120 filmmakers worked for the regime, as cinema was an instrument of propaganda. Nevertheless, one cannot say that the censors were too severe. They banned the films, but they respected the filmmakers. It gave them headaches... They allowed us to finish the film, before banning it. Otar Iosseliani.

Subir na vida

Ontem à noite, vimos L'assassino , de Elio Petri. A história de um antiquário de origens modestas que compra e vende objectos antigos com o mesmo rigor com que mantém um activo comércio íntimo com mulheres «de boas famílias». O cenário é o da cidade de Roma, a eterna loja de antiguidades da velha Europa. O objecto que permite à polícia desvendar o crime é um antigo relógio de ouro que o protagonista oferece à vítima, na noite do assassínio. Os minutos, as horas, os anos avançam. Os relógios passam de mão em mão, de geração em geração, entre vítimas e culpados - quem são as vítimas, quem são os culpados? -, e a história pouco muda. Sobe-se na vida, desce-se ao inferno. (Adenda.) No último plano de Era uma vez um melro cantor , de Otar Iosseliani, lembro-me agora, um relojoeiro - numa série de gestos parecidos com os de um cirurgião - devolve à vida um relógio que tinha parado. Terminado o filme, a máquina do tempo volta a funcionar. O mundo retoma a sua marcha. Culpados e inocentes,...

Espaço

O confinamento e «Abril» , de Otar Iosseliani, provam várias coisas. A saber: bancos, cadeiras e cadeirões ocupam muito espaço. Os espelhos, as cristaleiras e os aparadores também. Mesas, secretárias e estantes exigem muito, muito espaço. Assim como os frigoríficos e os fogões. Os sofás são das coisas que ocupam mais espaço. Pequenos objectos, como pratos, copos, talheres, e pequenos electrodomésticos, como ventoinhas, aspiradores ou torradeiras, em conjunto, ocupam espaço a mais. O amor, a música e as árvores não ocupam espaço, mas definham em espaços demasiado preenchidos.