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Singurătate şi destin

Durante muito tempo houve sobre a mesa de Cioran um caderno sempre fechado.  Após a sua morte, ao juntar os seus manuscritos para os confiar à Biblioteca Doucet, encontrei trinta e quatro cadernos idênticos. Só diferiam nas capas marcadas com um número e uma data. Iniciados em 26 de Junho de 1957, pararam em 1972.  Durante quinze anos, Cioran manteve no seu escritório, à mão, um desses cadernos, que parecia ser sempre o mesmo e que nunca abri. Neles encontramos entradas geralmente breves («Tenho o fragmento no sangue»), e a maior parte das vezes sem data. Apenas os acontecimentos considerados importantes estão datados, quer dizer, os passeios no campo e as noites de insónia — o que dá:  «Domingo, 3 de Abril. Caminhei todo o dia pelos arredores de Dourdan...»  «10 de Abril. Segui pelo canal Ourcq.» «24 de Novembro. Noite medonha.»  «4 de Maio. Noite atroz.»   Apesar do carácter repetitivo e monótono, guardei todas as passagens pois essas antífonas estão...

Vida de gato

Cioran nunca fala disso, nem nos Cadernos.  Fala das doenças, da falta de dinheiro, mas creio que nunca se apercebeu que a vida que levava era a que mais lhe convinha: uma verdadeira vida de gato.  Acho que só Simone Boué sabia que ele tinha essa sorte.
Simone Boué : (…) Anos mais tarde, Sanda Stolojan começou a traduzir Lágrimas e Santos  e vinha com muita frequência cá a casa, trazia o seu texto. Cioran exigia que eu estivesse presente, e eu, eu estava muito infeliz porque embora normalmente Cioran fosse simpático, afável, cortês, quando se tratava da escrita, de um texto, já não tinha essa gentileza. Dizia: é preciso cortar, isto não presta. Lembro-me de  Sanda a chegar, entrava e perguntava: «que mais vai cortar hoje»? Parece que a versão francesa de Lágrimas e Santos representa cerca de um terço do texto romeno. Sanda escreveu um prefácio para se defender, e Cioran decidiu reescrever algumas páginas, de modo a não termos a impressão de ler um texto traduzido do romeno; é principalmente o escritor francês que encontramos nesta versão. Recentemente, li a tradução em inglês e fiquei impressionada, o inglês presta-se mais à tradução do romeno, é menos rígido, e depois há essa profusão, esse lado barroco do estilo de Cioran ...