Durante muito tempo houve sobre a mesa de Cioran um caderno sempre fechado. Após a sua morte, ao juntar os seus manuscritos para os confiar à Biblioteca Doucet, encontrei trinta e quatro cadernos idênticos. Só diferiam nas capas marcadas com um número e uma data. Iniciados em 26 de Junho de 1957, pararam em 1972. Durante quinze anos, Cioran manteve no seu escritório, à mão, um desses cadernos, que parecia ser sempre o mesmo e que nunca abri. Neles encontramos entradas geralmente breves («Tenho o fragmento no sangue»), e a maior parte das vezes sem data. Apenas os acontecimentos considerados importantes estão datados, quer dizer, os passeios no campo e as noites de insónia — o que dá: «Domingo, 3 de Abril. Caminhei todo o dia pelos arredores de Dourdan...» «10 de Abril. Segui pelo canal Ourcq.» «24 de Novembro. Noite medonha.» «4 de Maio. Noite atroz.» Apesar do carácter repetitivo e monótono, guardei todas as passagens pois essas antífonas estão datadas. Os cadernos de Cioran n
de Cristina Fernandes e Rui Manuel Amaral