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Querido, onde é que estão os verbos?

Ainda sobre regras para escrever bem ou seguir um método que nos parece adequado (ambas as resoluções são becos sem saída), há uma história muito gira e bastante radical que o George Saunders conta na nota final de “Guerracivilândia em mau declínio”. Depois da fase Hemingway/Babel/Carver, Saunders tentou uma escrita ao jeito de Joyce/Lowry/Lawrence e escreveu um romance com o título “La boda de Eduardo” inicialmente com 700 páginas, reduzidas para 250 mas mesmo assim intragáveis, quase sem verbos e cheias de substantivos compostos. Pediu à mulher uma opinião sobre o manuscrito, ela desistiu ao fim de alguns minutos e, com extrema concisão e justeza, disse-lhe o seguinte: — Todas aquelas horas, para isto ? Querido, onde é que estão os verbos? Puseste-os num documento à parte, ou quê? E o que é aquilo com as palavras compostas e os joguinhos de palavras e toda aquela desesclarecedora embrulhada?
— Quem o inspira? Quais são os seus escritores favoritos? — Gosto mesmo muito dos escritores russos, especialmente do século 19 e início do século 20: Gógol, Tolstoi, Tchékhov, Babel. Adoro o modo como eles agarram os grandes temas. Também me sinto inspirado por uma certa tradição de cómico absurdo que incluiu influências como Mark Twain, Daniil Kharms, Groucho Marx, Monty Python, Steve Martin, Jack Handey, etc. E ainda, acima de tudo, adoro a tensão da ficção americana minimalista: Sherwood Anderson, Ernest Hemingway, Raymond Carver e Tobias Wolff. Isto foi o que George Saunders respondeu (respigado do arquivo da internet ). Aceito todos os nomes; as influências são uma espécie de cauda de pavão mas também podem funcionar como andaimes de construção — nada a opor. Talvez acrescentar. Agora que cheguei ao fim de "Guerracivilândia em Mau Declínio", apercebi-me de uma grande influência no estilo de Sauders. Talvez não seja assim tão grande; nem sequer influência porque

Mas agora a sério: Saunders não é um gajo infeliz.

Geralmente deixo as notas, prefácios e esse género de informações adicionais para o fim, gosto de saber do que falam para concordar, divergir ou ignorar — e como é que posso saber isso antes de ler os contos, o romance ou o que seja? Bom, costuma ser assim mas na “Guerracivilândia em Mau Declínio” baldei-me para a regra. É o meu terceiro livro de contos de Saunders, já deixei crescer um intenso afecto pelo autor, por isso fui direita às notas das últimas páginas sobre as circunstâncias em que o livro foi escrito (segmento: o escritor é o escritor e as suas circunstâncias). Como é habitual nos contos, também aqui: é tudo divertido e sórdido, Saunders revela uma extraordinária capacidade de desenrolar frases vulgares (um maná para os tradutores) sobre cenários complexos, as personagens passam a vida a tropeçar e a elevar-se, as situações complicadas tendem a complicar-se ainda mais antes de estourarem de modo suave. “Subitamente, senti-me como se estivesse a levar um enxerto de porr