Sempre que volto a ver um filme de John Ford, fico presa. Já conheço as personagens, os actores, as paisagens — é tudo familiar e essa proximidade leva-me a perceber melhor as razões (ou contradições?) de cada um e a profundidade de campo da história . No caso d’ O homem que matou Liberty Valance (1962) , há um traço que divide os territórios de Tom Doniphon e de Ransom Stoddard. Ambos desejam mais ou menos o mesmo, mas um acredita que a justiça é uma coisa pessoal que passa pela defesa armada rápida (ou ataque, se for caso disso) e o outro acredita na protecção da lei (e dos livros) para todos. Um representa o passado; e o outro, o futuro de uma república democrática fundada sobre uma Constituição cujo preâmbulo abre com as palavras «nós, o povo». Ora nem mais, o povo. O filme começa com Doniphon dentro de um caixão simples e barato, sem pistolas nem botas, um tipo que não tem onde cair morto está para ali à espera de voltar à terra a que sempre pertenceu. Stoddard, pelo contrário, é