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Andar em círculos

Fomos ao Trindade rever Underground , de Kusturica. Na minha memória, era o último filme do realizador que ainda valia a pena ter em conta. Meia desilusão. O último terço do filme já anuncia o Kusturica grotesco, reaccionário, ubuesco, no pior dos sentidos. Tinha bons motivos para ter esquecido essa parte. Há, no entanto, uma cena que quero reter: a cadeira de rodas com os corpos dos velhos amantes em chamas, às voltas, sem parar, em torno de um crucifixo com o Cristo tombado. Pouco importa o que está imediatamente antes e o que vem depois. Quero fixar apenas essa cena. Lembra-me a carrinha a rodar em círculos, sem ninguém ao volante, de Os Anões Também Começaram Pequenos , de Herzog. Ou os carros na rotunda em Playtime , de Tati. Mas uma cadeira de rodas em chamas à volta de um crucifixo mutilado é outra coisa. É a imagem do relógio do mundo, movido a ódio, cegueira e violência.

É aí que ele encontra o seu melhor alimento

Ora, estas mesmas pessoas não só estão atemorizadas, como são ao mesmo tempo temíveis. Quando vêem enfraquecer aqueles mesmos que ainda agora temiam, o estado de espírito passa da angústia para o ódio declarado. E não é só na Europa que se encontram grupos desta espécie. O pânico condensa-se, no momento em que o automatismo aumenta e se aproxima de formas perfeitas, como na América. É aí que ele encontra o seu melhor alimento; expande-se através de redes que competem em rapidez com o relâmpago. Já a necessidade de receber informações várias vezes por dia é um sinal de angústia; a ilusão cresce e paraliza-se em rotações aceleradas. Todas estas antenas das cidades-cogumelo assemelham-se ao cabelo eriçado. Eles desafiam os contactos demoníacos. Está visto que o Leste não constitui uma excepção. O Ocidente tem medo do Leste e o Leste do Ocidente. Vive-se em todos os pontos do mundo na expectativa de ofensivas temíveis. Em alguns deles, acrescenta-se o medo de uma guerra civil. O mecanismo

Horror

Guerra, assassínio, ódio, genocídio, extrema-direita. Parece tudo tão óbvio, tão ostensivo, como um murro no estômago. A repetição de um filme de horror já visto. E, no entanto, não consigo evitar a permanente sensação de que os jornais usam uma língua que não conheço, uma escrita feita de hieróglifos impossíveis de decifrar. A terrível sensação de que falta sempre uma peça ao conjunto. Qualquer coisa que só irei compreender no último momento, quando o tempo se tiver esgotado. Aquilo que Karl Kraus viu desde o princípio e que eu não consigo ver. Ou que — e este é o drama — prefiro não ver.

Facebook permite temporariamente posts violentos contra tropas russas ou que peçam morte de Putin.

A Meta [empresa do facebook] vai permitir, ainda que temporariamente, que os utilizadores do Facebook e do Instagram de alguns países clamem por violência contra soldados russos. Esta informação consta de uma série de e-mails a que a agência Reuters teve acesso nesta quinta-feira e que falam de uma mudança temporária na política de discurso de ódio das plataformas. A empresa de redes sociais também vai autorizar a divulgação de publicações que peçam a morte dos presidentes russo, Vladimir Putin, ou bielorrusso, Alexander Lukashenko, em países como a Rússia, Ucrânia e Polónia, de acordo com um conjunto de e-mails internos enviados para os moderadores de conteúdos. (...) Foi dito ainda que os apelos à violência contra os militares russos são permitidos quando a publicação se refere claramente à invasão da Ucrânia. Estas mudanças temporárias nas políticas da empresa aplicam-se na Arménia, Azerbaijão, Estónia, Geórgia, Hungria, Letónia, Lituânia, Polónia, Roménia, Rússia, Eslováquia e Ucrâ

O ódio tocou à campainha

O ódio tocou à campainha e nós abrimos a porta. Não precisou de esperar muito. Nós ouvimos bem. Temos uns ouvidos sensíveis. Bastou tocar uma vez. Estávamos à sua espera. Há muito que o esperávamos. Há mais de quarenta anos. Há séculos e séculos. Estamos sempre à sua espera. Nós gostamos do ódio. Gostamos que se sente à nossa mesa, que beba um cafézinho, um digestivo. Ou, se preferir, uma cervejinha e um pratinho de tremoços. Gostamos muito de o ouvir falar. Se não fosse o ódio, quem teria «a coragem de dizer as verdades»? O ódio «não tem medo das palavras». O ódio «fala claro para as pessoas lá em casa compreenderem». O ódio é «justo», o ódio é «bom». Foi ao ódio que «Deus atribuiu a missão de mudar Portugal». O ódio vai salvar-nos. Se não odiarmos, o que nos resta? Odiar-nos a nós mesmos?