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Trincapregos é parecido com o António Silva das comédias dos anos 30 e 40. Primo , na compleição física.  Secundo , na fome avassaladora.  Tertio , nos gestos e palavras pomposas.

Adagas, fitas, rosas e espadas.

Tringapregos dá nome ao livro e compreende-se porquê — é uma personagem de alto gabarito. Grandioso. Tem tudo em demasia e tudo em falta. Porém, apesar do paleio imponente, das alcunhas cómicas e dos trajes ridículos (ah, a maravilha de imaginá-los), Trincapregos é apenas um dos “Valorosos” — um grupo de judeus da ilha grega de Cefalónia, os cinco primos Solal, homens desenfreados, sentimentalões, farsolas, pícaros, chanfrados e muito mais (...) judeus do sol e do bom humor eloquente e cavalheiresco, nós judeus do Mar e das maneiras elegantes, descendentes dos judeus de Espanha a cavalo, que andaram vestidos de seda e usaram adagas, fitas, rosas e espadas (...). O livro cresce em redor das peripécias destas personagens extravagantes. Através de aventuras calhadas para o torto, Albert Cohen capta o lado mais solar da existência — uma vida cheia de cores, de cheiros, de comida, de corpo, efervescente, zombeteira, imperfeita, desgraçada, de excesso, mais dionisíaca que o próprio Dionísi

Uma assustadora retenção

— Tens razão, reconheceu Trincapregos fazendo estalar as mãos imensa. Se eu não mentisse, que me restaria? Mas os romancistas mentem mais fundo do que eu. Todos eles fazem maus livros, que fazem crer às donzelas que o amor é um viveiro do paraíso e às mulheres que o casamento é um esgoto! Mentirosos, verdadeiros mentirosos e envenenadores, todos esses distintos escritores que mostram as suas poéticas heroínas bebendo e comendo de uma maneira encantadora e trincando com um ar obstinado algumas grainhas de uva. Muito bem, meus senhores, permitam-me que me espante de que nunca nos falem das consequências dessas trincadelas obstinadas. Sim, meus senhores, desde Homero até Tolstoi, os jovens heróis e heroínas sofrem, sobretudo quando são belos, de uma assustadora retenção. Não podem mais. Por exemplo, há mais de trinta anos que uma tal menina Natacha Rostova anda a beber sem que o autor a autorize a retirar-se nem por um instante! Todos os amantes e todas as amantes de Shakespeare, de Racin

Debaixo do fogão

(...) A seguir Saltiel falou da perspicácia de um tal professor Freud. — Há alguém que roubou e que nega. Bem, levam-no a este médico professor, que olha para ele e diz: “A carteira está debaixo do fogão!” Trincapregos, de Albert Cohen, tradução de Pedro Tamen, Contexto, outubro de 1999, páginas 108 e 109.

Uma pessoa instruída

E logo a seguir disse aos seus correligionários que aquela pequena nuvem, lá em cima, lhe recordava o ilustre dramaturgo inglês Shakespeare. Depois apontou para uma poça de água e afirmou com desembaraço aos velhos pasmados que ela “continha o ambiente de certos romances de Georges Sand”. — Instruído, baliu o centenário, sacudindo debilmente a sua mão enrugada. — Deus to guarde, ó Abraão, disseram os outros, maravilhados. E Jónatas continuou a brilhar, a mostrar como estava armado para a vida com os dons do espírito, para a imensa glória do seu gordo e inchado pai, que o olhava com frágil meiguice de apaixonada, e sorria nesciamente, enfeitiçado por aquele quase-Messias que pusera neste mundo. Trincapregos, de Albert Cohen, tradução de Pedro Tamen, Contexto, outubro de 1999, página 50.