Se pronunciei atrás «… aos mortos» foi afinal para que essa multidão anónima veja agora tudo quanto não pôde ver em vida, agarrada que estava aos ossos. Pois é preciso uma arte – não fluida, antes pelo contrário, muito dura – dotada do estranho poder de penetrar os domínios da morte, capaz de se infiltrar pelas paredes porosas do reino das sombras. A injustiça – e a nossa dor – seriam demasiado grandes se um único nessa multidão fosse impedido do contacto com alguém entre nós, e bem pobre será nosso triunfo se apenas nos conduz a uma glória futura. A obra de Giacometti transmite ao povo dos mortos o conhecimento da solidão de todos os seres e de todas as coisas, solidão, nossa mais certa glória. (…) Solidão, como eu a entendo, não designa estatuto de miséria mas secreta soberania, nem profunda incomunicabilidade mas conhecimento mais ou menos obscuro de uma singularidade intocável. Jean Genet, "O Estúdio de Alberto Giacometti", tradução de Paulo Costa Domingos, Assírio