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Dos jornais III

Não é preciso artes de bruxaria para ver o futuro; as notícias que vou lendo das catástrofes provocadas pelas alterações do clima na Grécia são o nosso futuro. As imagens parecem saídas dos filmes bíblicos dos estúdios de Hollywood — já sabemos como é que a história acaba.

O tempo presente e o tempo passado estão ambos talvez presentes no tempo futuro

Num certo sentido, os mortos são criaturas dóceis. Posso afirmar — com leviandade mas sem oposição — que Cioran escreveu estas notas depois de ter lido a crónica de hoje do Guerreiro:  «Tenho uma percepção tão directa dos desastres que o futuro nos reserva, que me pergunto onde ainda encontro força para enfrentar o presente. (...) Se pudéssemos ver o nosso futuro, enlouqueceríamos de imediato.  (...) Por mais desiludidos que sejamos, um dia havemos de parecer necessariamente ingénuos, pois o futuro excederá em muito as nossas visões mais sombrias. (...) O meu tempo não é o tempo da acção: agir é viver no presente e no futuro imediato. Mas eu só vivo no passado longínquo e num futuro ainda mais longínquo.  Diz-se (diz a ciência) que a Grã-Bretanha ficará completamente submersa e coberta de água daqui a quinhentos mil anos. Se fosse inglês, bastaria esse facto por si só para me paralisar e para justificar a minha recusa à acção.»

E que futuro

Visão de desabamentos. É nisto que vivo de manhã à noite. Tenho todas as enfermidades de um profeta, não os dons.  E, no entanto, sei — com um saber impetuoso, irresistível — que possuo senão luzes, em todo caso lampejos sobre o futuro. E que futuro, Deus do céu!  Sinto-me contemporâneo de todos os pavores futuros.  A minha grande predilecção pelos naufrágios. Emil Cioran, Cadernos 1957-1972