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Um trabalho de vida

Por que é que o velho marinheiro, da balada de Coleridge, mata o albatroz? Porquê? Não se sabe, responde Alberto Pimenta . Talvez por diversão, por tédio, porque estava aborrecido, porque não tinha nada melhor para fazer. Não se sabe. «Estará aqui» - pergunta Alberto Pimenta - «não só o fundo de todo este poema, como até o próprio caminho que leva à poesia? É talvez uma compulsão dessas que habita e sempre habitou o poeta.» O certo é que a bala que atravessa o corpo do inocente albatroz também condena a tripulação à morte. A natureza vinga-se. O marinheiro é condenado à morte-em-vida e à eterna compulsão de narrar a história, uma e outra vez, que é o mesmo que a reviver continuamente. Alberto Pimenta propõe uma hipótese: «Esta compulsão de quase permanentemente refazer, narrando, o próprio crime, ou falha, ou falta, ou desvio inicial, é provavelmente o arranque que leva a qualquer narração poética, que se torna assim um trabalho de vida. (...) Quer dizer que poesia que claramente o é,

Pimenta

O que há de mais impressionante em O Homem-Pykante - Diálogos Kom Pimenta é justamente a presença avassaladora de Alberto Pimenta. Se Pimenta se mexe um pouco para a direita, a imagem descai para a direita. Se Pimenta sai do plano, o filme desaparece. A força do poeta — as mãos, o rosto, os olhos e, acima de tudo, a voz — domina a tal ponto o filme que o trabalho de Edgar Pêra corre em segundo plano. Na verdade, tudo o que Pêra possa acrescentar e que não se foque na figura de Alberto Pimenta (os planos de pantomima na porta aberta para o rio, por exemplo) estará sempre a mais. O sujeito do filme é o filme. A sala de cinema transforma-se então numa casa de oração e nós em fiéis e crédulos adoradores de um estranho xamã. Não interessa se a história que Pimenta conta a seu respeito é ou não verdade. Estamos prontos a acreditar em tudo. Nesse sentido, Alberto Pimenta é o realizador do filme de Edgar Pêra. E é exactamente este equívoco autoral que faz do filme não uma simples homenagem