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A mostrar mensagens com a etiqueta Henry David Thoreau

Que se lixe o céu

Foi logo no início do filme. Enquanto Cary se veste para ir a uma festa, a filha anda pelo quarto a serigaitar e a dizer uns disparates freudianos aprendidos à pressa; às tantas pega num livro que está pousado na mesinha de cabeceira e pergunta-lhe: estás a ler isto? Nem espera pela resposta, ao ver a mãe, belíssima num vestido vermelho decotado, larga o livro e volta a palrar, agora sobre as mulheres egípcias enterradas vivas (depois havemos de saber que a miúda é tremendamente conservadora e as suas ideias — mais os óculos e o lencinho — não passam de teorias pré-casamento).  É um pormenor que passa despercebido, em princípio não é importante. Pois, mas esse livro cujo título fica fora de campo criou um sobressalto na minha cabeça — igualzinho à ervilha debaixo do colchão. No regresso a casa ainda vinha a pensar no mistério. Queria que o livro fosse para Cary o que Walden era para Ron. A cada hipótese que lançava, criava uma mulher diferente, menos medrosa, mais descarada, etc...

O que não se consegue perceber a cem por cento

Um dos meus parágrafos preferidos de Walden , talvez o preferido, é este, na secção “Economia”:   “Há muito tempo perdi um cão de caça, um cavalo baio e uma rola; procuro-os até hoje. Falei com muitos viajantes sobre eles, descrevendo os seus percursos habituais e os chamamentos a que respondiam. Um ou dois tinham ouvido o cão, o galope do cavalo e até visto a rola desaparecer atrás de uma nuvem, parecendo tão ansiosos por encontrá-los como se eles próprios os tivessem perdido.” ( minha tradução, para a Relógio D’Água ).   Gosto particularmente desta passagem pelo facto de resistir às explicações dos comentadores,  que a consideram o momento mais enigmático do livro. Todos os livros deviam ter passagens que os leitores, os comentadores e os tradutores não conseguem perceber a cem por cento — e que os autores não querem decifrar. Os estudiosos tentam identificar as possíveis referências do cão de caça, do cavalo baio e da rola que Thoreau menciona, especulando qu...