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A mostrar mensagens com a etiqueta August Strindberg

Strindberg, outra vez

As personagens escutam atrás das portas, os móveis têm gavetas secretas, os papéis voam, as fotografias caem das paredes, os mortos falam por carta com os vivos. Os vivos vêem coisas, pressentem outras, bebem sem parar para não ficarem sóbrios, mentem uns aos outros - os mortos são os únicos que não mentem -, lançam fogo à casa. «Não há remédio?», pergunta o filho. «Não, não há remédio», responde a mãe. O Pelicano , de Strindberg, é uma história de terror.

Inferno

A noite aproxima-se. Strindberg fecha-se no quarto e prepara-se para mais um combate nocturno com o invisível: «Ponho a capa militar, o boné e as botas, decidido a dormir vestido e a morrer como um guerreiro cheio de bravura, que desafia a morte depois de enfrentar a vida.» E logo a seguir: «Cerca das onze horas, a atmosfera do quarto começa a ficar pesada e uma angústia mortal vence-me a coragem.»

Três más notícias

25 de Junho. - Sou convidado para ir a casa do chefe do ocultismo científico, director de L'Iniciation . Ao chegarmos a Marollesen-Brie, o doutor e eu somos recebidos por três más notícias: uma doninha matou vários patos, uma criada adoeceu, a terceira já me não lembra. Strindberg, Inferno . Tradução de Aníbal Fernandes.

Os salvadores

É verdadeiramente comovente a preocupação da extrema-direita e dos ultraliberais pela «situação a que chegaram os nossos serviços públicos». A propósito destes benignos e sensíveis defensores do estado social, ocorre-me uma passagem de Um Sonho , de August Strindberg, na qual a tripulação de um navio em perigo «grita horrorizada ao ver o seu salvador» e «atira-se ao mar, com medo dele».

Os tipógrafos conhecem o nosso estilo

- Já agora, Falk, estiveste no Teatro de Djurgården? - perguntou o alto. - Não. - É uma pena. O Lundholm e o seu grupinho de escroques actuam lá de momento. Que coisinha lamechas! Não enviou bilhetes ao [jornal] A Víbora , e quando lá fomos esta noite expulsou-nos. Mas vingar-nos-emos. Gostarias de desancar naquele suíno? Aqui tens um lápis e um papel. Intitulá-lo-ei Teatro e Música, Teatro de Djurgården ; agora, podes escrever! - Mas nem sequer vi o que a sua companhia tem em palco! - Que diabo tem isso que ver com isto? Nunca escreveste sobre coisas que não viste? - Não, nunca o fiz. Denunciei casos de corrupção, mas nunca ataquei pessoas inocentes. E não conheço a companhia. - São uns imprestáveis. Não passam de refugo! - confirmou o gordo. - Afia o lápis e espeta-o onde dói; és bom a fazê-lo. - Porque não o esfaqueiam vocês mesmos? - Porque os tipógrafos conhecem o nosso estilo e trabalham amiúde como actores secundários no teatro, à noite. August Strindberg, O salão verme...

Banalidades

- Então não tem mesmo respeito nenhum pela sua arte? - Pela minha arte? Porque deveria ter mais respeito pela minha arte do que pela de qualquer outro? - Mas interpretou os grandes papéis; interpretou Shakespeare, interpretou Hamlet, não foi? Nunca se sentiu tocado na essência do seu ser ao proclamar o profundo monólogo «Ser ou não Ser?» - O que quer dizer com profundo? - Bem, profundo e penetrante! - Explique-se. O que tem de tão profundo dizer coisas como «Devo ou não matar-me? Ficaria feliz por cometê-lo se soubesse o que existe depois da morte (como qualquer outra pessoa). Mas não sabemos, por isso não nos atrevemos a tirar as nossas próprias vidas.» O que tem isso de profundo? - Bem, se o coloca desse modo... - Exactamente. Não tenho dúvidas de que pensou em tirar a sua própria vida em alguma altura, não pensou? - Sim, toda a gente o fez. - E porque não o fez? Porque, como Hamlet, não se atreveu, porque não tem a certeza do que existe depois! Estava então a ser especialm...

Como seres humanos e não como livros

No seu estado parcialmente inebriado, Falk sentia-se muito bem: aquele sítio era quente, luminoso, barulhento e fumarento, e encontrava-se rodeado de pessoas cujas vidas prolongara por algumas horas e que, por conseguinte, estavam tão contentes quanto moscas reavivadas pelos raios do sol. Sentiu-se parte de uma unidade que com eles formara, uma vez que, no geral, eram infelizes, modestos e educados; percebiam o que ele dizia e, quando falavam, expressavam-se como seres humanos e não como livros. August Strindberg, O salão vermelho . Tradução de João Reis.