Carta para Fernando Savater Paris, 10 de dezembro de 1976 Querido amigo, Em novembro, quando passou por Paris, pediu-me para colaborar num volume de homenagem a Borges. A minha primeira reação foi negativa; a segunda… também. Para quê venerá-lo quando as próprias universidades já o fazem? A má sorte de ser conhecido abateu-se sobre ele. Merecia melhor. Merecia permanecer na sombra, no imperceptível, manter-se tão esquivo e tão impopular como uma nuance. Era aí que se sentia em casa. A consagração é a pior das punições — para um escritor em geral, e muito especialmente para um escritor do seu género. A partir do momento em que todos o citam, já não o podemos citar ou, se o fazemos, temos a impressão de estar a engrossar a legião dos seus «admiradores», dos seus inimigos. Na verdade, aqueles que querem a todo o custo prestar-lhe justiça, mais não fazem do que precipitar a sua queda. E fico por aqui, porque se continuasse neste tom acabaria por me compadecer do seu destino
de Cristina Fernandes e Rui Manuel Amaral