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Se publicar isto, confiscamos o livro

Juan Filloy, em 1987. Nunca se interessou pelo sucesso, nunca se preocupou com isso? Absolutamente. E talvez por isso ele nunca tenha chegado. Ao longo da vida, não mexi um dedo, não bati à porta de uma editora. Pagava as minhas próprias edições: 300, 400 exemplares, impressos em gráficas de Rio Cuarto, e algumas de Buenos Aires, que depois distribuía pelos amigos. Fazia edições que designava por «edita mi corum». Nunca vendi um livro. Foi um worst-seller . Sim. E quando me envolvi com uma editora de Buenos Aires, assinei três contratos para a edição de 6000 exemplares. Editaram três romances ( Op Oloop , ¡Estafen! e La Potra ), mas não o que tenho em maior estima, Caterva . É um romance estuário: tem 560 páginas. É um bom romance, para muitos leitores o melhor que já escrevi. Sempre pensei que considerava La Potra como o seu melhor livro. Ah, sim, o que digo é que muitos amigos gostam mais de Caterva . Eu, claro, gosto de La Potra , e também de Op Oloop . Por outro lado, ¡Estafen! ...

A minha biblioteca é mais divertida do que a tua, Alberto.

Aproveitei o fim de semana de chuva e nuvens para limpar os livros. Tirando algumas colecções, autores ou temas que têm direito a uma prateleira inteira, arrumei os restantes por ordem alfabética. Às vezes tive de fazer pequenas falcatruas. Por exemplo: empurrei Guillaume Apollinaire mais para a frente para o Rui Manuel Amaral ficar juntinho ao Roberto  Arlt . Robert Walser é o escritor mais poliglota da minha biblioteca. Tenho livros em português, francês, inglês e alemão — ocupam trinta e cinco centímetros. Descobri três livros repetidos.

Influenciadores do século XX

Roberto Arlt.

O escritor como operário

Se o meu amigo conhecesse os bastidores da literatura, saberia que o escritor é uma pessoa cujo ofício é escrever, como outros têm o ofício de construir casas. Nada mais. O que o distingue do fabricante de casas é que os livros não são tão úteis como as casas e, além disso... além disso, o fabricante de casas não é tão vaidoso como o escritor. Hoje em dia, o escritor considera-se o centro do mundo. Conta toda a espécie de patranhas. Engana a opinião pública, consciente ou inconscientemente. Não revê as suas opiniões. Acha que o que escreve é verdade só pelo facto de ter sido ele a escrever. É o centro do mundo. (...) Todos nós, que escrevemos e publicamos, fazêmo-lo para ganhar a vida. Nada mais. E para ganhar a vida não hesitamos por vezes em afirmar que o branco é preto e vice-versa. De resto, há momentos em que até nos permitimos o cinismo de nos rirmos e de nos acharmos génios... Roberto Arlt, Águas-fortes portenhas .

Fazer-se de morto

Há três dias que, como certos personagens de Roberto Arlt , me faço de morto. Talvez mais. Não, não é «talvez mais»: faço-me fervorosamente de morto há muitos dias. Não funciona. Sou tão inábil na nobre arte de fingir-se morto que não mereço sequer uma nota marginal entre os personagens secundários de Roberto Arlt.

Influenciadores do século XX

Ladrão que rouba a ladrão

Quando não há nada para escrever, nenhum motivo, nenhuma ideia, o que fazer? A resposta clássica é: escrever sobre o facto de não existir nada, nenhum motivo, nenhuma ideia, para escrever. Roberto Arlt , como qualquer escritor que viva de escrever crónicas para os jornais (espécie em extinção), era um especialista nessa nobílissima arte de «encher chouriços»: Às vezes, quando estou aborrecido e me lembro de que num café que conheço se reúnem alguns senhores que trabalham como ladrões, encaminho-me até lá para escutar histórias interessantes. E a partir daqui já nada o fará parar.