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Verão no escritório

Por estes dias, alguns colegas de trabalho trazem os filhos para o escritório porque não têm onde os deixar. São quatro crianças pequenas. Brincam às escondidas pelas salas, lançam-se esbaforidas pelos corredores, tropeçam nos cabos das impressoras, falam e riem alto. Põem tudo de pernas para o ar. Um pequeno bando de demónios traquinas a espalhar o pânico num mosteiro trapista.

Comunidade

Deixámos a janela aberta durante a noite para refrescar o quarto. Automóveis, gaivotas, bandos de turistas ébrios e os dois cães da vizinha bateram as asas e vieram deitar-se connosco. A velha comunidade, a minha tão bem conhecida comunidade das noites sem dormir.

Fugir do verão como da peste

Devia reconsiderar o «problema» do suicídio: parece que negligenciei os seus aspectos mais interessantes. Podia considerá-los agora, pois notei que é de preferência no verão que me sinto disposto a abordar uma questão destas. Será o calor? Será a luz? O sol sempre me incitou a repensar este mundo e despertou em mim crises de melancolia às vezes insuportáveis. As minhas «trevas» impedem-me de me pôr em uníssono com o esplendor envolvente; do choque entre o que sinto e o que vejo nasce este estado de humor negro e tudo o que daí advém.  O verão é a estação das grandes impossibilidades. O sol é um fornecedor de ideias negras . Nada convida tanto à melancolia como uma paisagem devastada pela luz. Fugir do verão como da peste. Emil Cioran, Cadernos 1957-1972  

Virtudes

Domingo de tarde. Está calor. Estendemos as toalhas nas Virtudes, debaixo de uma oliveira, e pomo-nos a ler: «Estava ali como na sua varanda, ao sol de Maio, o jornal em cima do rosto e uma vareja a zumbir em volta dele, tétrica» (Agustina, Escritos sobre Cinema, p. 67.)

(como nas ilhas)

Verão tardio é o verão já fora da estação; atrasado; serôdio (palavra formidável para usar nos debates parlamentares). Mas se seguirmos a tendência deste outubro suave, acho que podemos arrastar a expressão para outro significado: o verão que só vem à tarde, como no filme do Rohmer; uma ocupação meteorológica em part-time (como nas ilhas).

Nesse tempo era sempre uma festa

Só descobri hoje que saiu uma nova tradução d' O Belo Verão (a capa de João da Câmara Leme para a Portugália é mais bonita, mas esta edição resgata o adjectivo). Pode ser mais um sinal do meu crescente alheamento do mundo. Por outro lado, ler Pavese neste verão tardio e sem futuro é um gesto intimamente  pavesiano .

Ocorrências

Lá fora estão trinta graus. Dentro de casa estão mais dez. A água ferve nas torneiras. A louça do pequeno-almoço seca na banca em poucos minutos. A ventoinha abana a cabeça, vezes sem conta, como que para afastar ideias tristes. As portas estalam. Os móveis rangem. Ou serei eu?

Novo horário de Inverno

Na estação de metro dos Aliados, os painéis informativos lembram que o “novo horário de Inverno” entra em vigor amanhã, 8 de Setembro. No interior da estação, a vinte metros de profundidade, o ar é fresco. No exterior, o Verão ainda estala sob uns inclementes trinta e tal graus. A velha máquina do mundo já não domina o tempo. O pensamento avança veloz para o futuro. O corpo arrasta-se em sentido inverso.

Observações avulsas sobre a boavista #7

Discussão sobre as coisas altas

Talvez por causa do tempo contra a estação; por me ter afastado pouco de casa; por conseguir finalmente estar-me nas tintas para tantas coisas diversas. Por tudo isto, as férias de agosto não pareceram férias. Foi uma sensação melhor, como se já estivesse desempregada (de longa duração), disponível apenas para rotinas básicas, a dar o mínimo da minha vida .