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A mostrar mensagens com a etiqueta Calor

Consolidação do inferno

É bastante irónico que nos aproximemos tanto e tão depressa de uma versão rasca do inferno feita de calor e fogos. A realidade assemelha-se às imagens infantis dos folhetos que as testemunhas de Jeová nos oferecem na rua como se fossem rebuçados. Talvez a ideia de Cioran de um Deus trocista — um Criador que se risse da Criação — se tenha materializado.

Não

A ventoinha roda a cabeça, uma e outra vez, negando tudo: não, não, não. Bartleby mecânico, sem palavras, a agitar levemente os papéis sobre as secretárias. O único «não», surdo e sumido, que o mundo consente aos empregados de escritório.

Tempestuosa temperatura

Apesar do Sol declinante, o calor sufocava naquela região de África, vizinha do Equador, e cada um de nós sentia-se duramente incomodado pela tempestuosa temperatura que a brisa não conseguia alterar. Raymond Roussel, Impressões de África . Tradução de Júlia Ferreira e José Cláudio.

Apanhar a fresca

Revelação

Era uma da tarde quando saí da sessão clandestina de Vitalina Varela em enorme sobressalto. Senti o sol, o calor e os turistas como uma afronta. Refugiei-me na Igreja de São Roque. As revelações também acontecem aos ateus: sentada e de olhos fechados, percebi os verdadeiros perigos que os filmes de Pedro Costa enfrentam: o amor apostólico, a estetização danosa.

Casa & Jardim

Varanda pequena, virada ao sul. As plantas demoram a adaptar-se ao calor excessivo. Já apareceram ervas daninhas — é bom sinal. Num dos vasos cresceu um caule tenro com ramificações; dá-me pelo ombro. A minha ambição é desmedida: um matagal.

Observações avulsas sobre a boavista #3

Hoje a avenida da Boavista parecia um jogo electrónico antigo cheio de pistas esquisitas. Não sei se é influência do Leão de Belfort, se é deste calor exagerado, se é de acordar demasiado cedo. Logo no início, uma t-shirt branca com uma espécie de labirinto estampado na frente enfiada numa cruzeta pendurada na porta do restaurante vegetariano (acho que era o meu número); mais adiante, um pássaro cansado; junto ao bingo, um cartaz publicitário de um banco encravado a meio com esta frase à altura dos meus olhos: “nunca deixe de procurar”. Procurar o quê? Precisava de um dicionário de pistas, mas um livro desses, tão perigoso, deve estar escondido num túmulo no oriente e o Indiana Jones já está velho para resgates. Ou então; talvez seja necessário outro o género de herói? Talvez precise daqueles calhamaços que ligam uns para os outros e Groucho Marx vende nas corridas de cavalos como se fossem gelados. Ou então, pelo menos, um gelado. Isso deve servir.