Se a PSP ou a GNR de Santarém abrirem uma vaga para redactora de acidentes , concorro para o lugar. Tenho alguma prática na descrição técnica de desastres.
Pareço as testemunhas de Jeová da rua a tentar convencer os fiéis a irem à sessão Da Nuvem à Resistência . Até já lhes passo papeizinhos com a palavra do senhor para a mão.
Quando começo a escrever sobre filmes, pareço polícia ou detective. Desconfio de tudo (eu incluída, pois claro); tento desvendar um crime ou, pelo menos, o mistério.
Consulta de rotina. A médica pergunta como me sinto. Respondo com frases banais, omito o diagnóstico mais justo: preciso de ver um filme de Rivette. (Não, isso não chega, preciso de estar dentro de um filme de Rivette.)
Entre outras coisas, não estar nas redes sociais e ter um telemóvel de vinte euros descreve-me como uma pessoa antiquada — o que não é completamente errado. Aos poucos, essa falha comunicacional começa também a qualificar-me como pessoa suspeita — talvez também não seja completamente errado, mas prefiro a palavra “duvidosa”.
Quando renovei o cartão de cidadão, a fotografia (que já era má) transformou-se num borrão negro — assusto-me sempre que a vejo. Pelo contrário, a fotografia da carta de condução é muito divertida, pareço alguém (distante) que já fez parte de uma banda (punk progressista?) e agora come cenouras. Nunca pensei que o sistema burocrático do estado pudesse alcançar revelações deste tipo.
Há certamente muitas explicações para o número infindável de pessoas que se fotografam uma e outra vez, dezenas de vezes, e publicam as imagens nas redes sociais. Uma delas tem de ser esta: provarem a si mesmas que ainda estão vivas.
In “Art and Morality,” an essay from 1925, D. H. Lawrence essentially predicts the selfie. Speaking of the new Kodak cameras, he writes: “To every man, to every woman, the universe is just a setting to the absolute little picture of himself, herself.” Dwight Garner.