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Mensagens

A mostrar mensagens de junho, 2016

E afinal as respostas não surgem

Você coloca perguntas, o leitor pensa ir encontrar as respostas, e afinal as respostas não surgem... AP - Isso faz parte integrante do meu modo de comunicar (...) Os meus textos têm muitas vezes um carácter enigmático, parecem não ter saídas. Isso é propositado. As saídas é o leitor que as tem que encontrar, eu não lhas posso fornecer. Senão caímos sempre no mesmo. Na História... A História é uma sequência terrível de pessoas a darem soluções aos outros (...). Seria um abuso da minha parte dizer como é que é bom, como se deve fazer... Alberto Pimenta, fragmento de entrevista incluído em Metamorfoses do video . Sábado, 2 de Julho, pelas 17h00, no Gato Vadio.

Balada

(...) Artur de Souza Gargo ficou também conhecido pelo seu grande chiste e espírito. Assim, conta-se que uma noite, numa recepção, estando seu filho Nuno à janela, a contemplar os astros por um óculo que lhe fora oferecido por sua tia Manuela, Artur Gargo veio por trás, pé ante pé, e dando-lhe um piparote que o fez bater com o óculo no olho, disse: «Agora é que tu viste as estrelas!» A hilariedade foi geral; uma vez mais Artur de Souza Gargo tinha dado mostras do seu sadio humor, tão português. A família ainda hoje gosta de contar o episódio e Nuno, o alvejado, é o primeiro a rir gostosamente, ajeitando a pala do olho. Alberto Pimenta, Metamorfoses do video . Sábado, 2 de Julho, pelas 17h00, no Gato Vadio.

Próximo sábado, 2 de Julho, pelas 17h00

No próximo sábado, 2 de Julho, concluimos mais um ciclo, o quinto, das Leituras do Gato Vadio. Haverá uma sessão-festa, com oferta de rebuçados e lambarices à tripa-forra, dedicada a Alberto Pimenta. A convidada é a Leonor Figueiredo e a imagem da leitura é do Luís Nobre, da dupla Lina&Nando . A entrada, como sempre, é livre.

Incomoda-me um pouco ter de escrever isto

Um homem acorda a meio da noite. Senta-se na beira da cama, coça as costas, resmunga qualquer coisa, tacteia o chão com os pés à procura das pantufas. Encontra as pantufas ao fim de sete segundos, mais coisa menos coisa, ajeita-as com a pontinha dos dedos e calça-as. Dirige-se à porta e, de repente, perde-se na escuridão do quarto. De vista curta e sem os óculos, começa a caminhar sem distinguir coisa alguma. Avança durante longos minutos, incapaz de encontrar o caminho. É como se levasse um tempo incomensurável a atravessar o quarto. “Estranho”, pensa modestamente. Há várias horas que caminha no escuro, tentando descobrir uma saída ou o sentido oculto de tudo aquilo. Não consegue vislumbrar nada além da profunda treva à sua volta. O cansaço obriga-o a abrandar o passo. Exausto, descalça as pantufas, deita-se no chão e tenta adormecer rapidamente para que a noite passe depressa. Os nervos, no entanto, mantêm-no acordado. Fecha as pálpebras com mais força; o sono não vem. Ergue-se de no

O homem estava a vender rosas no Areeiro

- Já te contei a história do homem que estava a vender rosas no Areeiro? - Não mana, não contaste. - O homem estava a vender rosas no Areeiro e ao lado estava outro homem a vender fruta. O da fruta já há um pedaço que dizia e repetia, virado para o ar, não para o outro, dizia e repetia: «Estou aqui, estou-te a ir à cara!» E o outro nada, como se aquilo não fosse com ele. Isto durou um bom pedaço, durante um bom pedaço. Até que de repente, quando menos se esperava, o vendedor de rosas disse para o outro: «Fazias melhor se me fosses ao cu!» Alberto Pimenta, Sex Shop Suey. Sábado, 2 de Julho, pelas 17h00, no Gato Vadio.
Ivan Goncharov.

Uma coisa tão de senso comum

Enquanto o tio falava, Alexándr mexia num maço de papéis. "O que é isso?" Alexándr esperara com impaciência aquela pergunta. "Isto… Queria mostrar-lhe… uns versos. Como já mostrou interesse…" "Não me lembro de ter mostrado qualquer interesse…" "Bem vê, tio, eu acho que o emprego é uma ocupação árida, em que não se põe a alma, e a alma tem sede de se exprimir, de partilhar com o nosso próximo os sentimentos e ideias, que a inundam…" "Bem, e depois?" perguntou o tio, com impaciência. "Sinto que a criação é a minha vocação…" "Ou seja, além do emprego, queres fazer qualquer coisa mais - é assim que devo interpretar o que dizes? Pois é muito louvável. E queres fazer o quê? Literatura?" "Sim, tio, queria pedir-lhe que se alguma vez tiver oportunidade de publicar qualquer coisa…" "E tens a certeza de que tens talento? Sem isso, serás um mau trabalhador na arte e de que serve? Se tens talento, então

Maçãneidade

Quando [Cézanne] dizia aos seus modelos: «Sejam uma maçã! Sejam uma maçã!», exprimia o que é prólogo da queda; não só a dos idealistas, tanto os jesuítas como os cristãos, mas a do colapso de toda a nossa forma de consciência substituindo-a por outra. Se o ser humano fosse essencialmente uma Maçã, como era para Cézanne, caminharíamos em direcção a um novo mundo de homens: um mundo com muito pouco para dizer, com homens que conseguiriam, apenas com o seu lado físico e uma verdadeira ausência de moral, manter-se tranquilos. Era o que Cézanne queria deles: «Sejam uma maçã!» A partir do momento em que o modelo começasse a impor a sua personalidade e a sua «mente» passasse a ser um lugar-comum, uma moral, ele sabia muito bem que iria ver-se obrigado a pintar um lugar-comum. A única parte da personalidade que não era banal, conhecida ad nauseam e um vivo lugar-comum, era a sua maçãneidade. O corpo e até mesmo o sexo eram conhecidos até à náusea, eram o connu! connu!, a cadeia infindável da