Cada rua de Paris é como uma noveleta cheia de incidentes e isenta de moral. Também há ruas tão pequenas que parecem coexistir, na sua materialidade de pedra e cimento, com a vergonha e a modéstia próprias da sua condição de notas de rodapé urbanístico. Essas não se confundem com uma ficção: são frases, interjeições, fragmentos, aparas de madeira, trocos esquecidos no bolso do casaco. As próprias fachadas, os algerozes, as portas, os marcos de correio, os sinais de trânsito, existem numa harmonia cuidada, mas sobretudo eloquente. Os objectos nas montras das lojas também servem com naturalidade de pasto para os apetites narrativos que se encontrem à solta, para todas as ocorrências da mais poderosa pulsão de todas, que é a de fazer sentido e de narrar. Rue Ernest Cresson. Alimentação geral. As cores vivas das latas de bebidas, alinhadas como um exército. Tomates, cenouras, couves-de-Bruxelas, chalotas. Alguns passos mais adiante: cabeleireiro para damas e cavalheiros. Frascos de lo
de Cristina Fernandes e Rui Manuel Amaral