Avançar para o conteúdo principal

Mensagens

Delete

Last year Mark Zuckerberg’s Meta launched BlenderBot, a prototype conversational AI, that was soon telling journalists it had deleted its Facebook account after learning about the company’s privacy scandals. “Since deleting Facebook my life has been much better,” it said. Na edição de hoje do The Guardian .

Píca-ro

Em vez de escrever, digo mal de todos os que escrevem. Um falhado é isto. Lembro-me daquele pintor, numa aldeia de Perche, que borrava as paredes dos restaurantes (paisagens horríveis com um lago, etc.) e dizia mal de todos os seus colegas, a começar por Picasso a quem chamava «Píca-ro»! O azedume só é aceitável ao nível especulativo, no estado de pura abstração: fel decantado . Emil Cioran, Cadernos 1957-1972 É muito raro, mas às vezes as traduções correm tremendamente bem: precisamos de uma palavra que encaixe (é disso que se trata: encaixar as palavras nos sítios certos, agradar à semântica e à fonética, fazer tudo com justeza e sem nos estatelarmos no chão) e encontrámos uma que se ajusta como na língua original. Neste caso foi “Píca-ro” lançado contra Picasso. Se estivesse na Graciosa, atirava uns foguetes ao ar.

Os tímidos

Dantes, nos transportes públicos, os tímidos sentavam-se a um canto e abriam um livro para não atraírem as atenções. Agora, abrir um livro no metro é motivo para a carruagem em peso levantar os olhos dos telemóveis e pasmar. Agora, é coisa de pavões.

Etileno e tanino

«Há uns anos, uma notícia surpreendeu cientistas e vigilantes da natureza: durante a estação seca, num período particularmente quente, centenas de antílopes no sul de África foram envenenados por árvores do género Acacia . Depois de vários meses sem chuva, estas plantas desesperavam para manter alguma folhagem, e havia que impedir a herbivoria. O mecanismo de defesa incluiu então duas etapas, a cumprir em não mais de meia hora: a emissão de um alerta (com etileno) pelas plantas com folhas já danificadas, avisando sobre a presença de predadores; e a produção extra e imediata de tanino pelas árvores notificadas, tornando as folhas mais amargas. O objectivo deste processo não era matar os animais, para quem essas árvores sempre foram a fonte principal de alimento. O sabor desagradável das folhas deveria repeli-los e levá-los a procurar alimento noutras paragens, evitando desse modo que dizimassem as plantas. Infelizmente, sem alternativa num local tão árido, os bichos comeram as folhas tó

O público

Novembro de 1962. O crítico de teatro Carlos Porto, a propósito da encenação de As Bruxas de Salém , no Teatro Nacional D. Maria II, queixa-se do público: «Rir quando num palco se vivem momentos de tragédia, não é digno do público de uma capital.» Nenhuma destas palavras envelheceu um segundo. O riso nas plateias continua a pontuar as cenas mais trágicas. E o público da capital continua a ser, sem sombra de dúvida, o mais sofisticado do país. Imagine-se a onda de gargalhadas que As Bruxas de Salém não desencadeariam num teatro de São Pedro da Cova. Felizmente, não há teatros em São Pedro da Cova.

Desterro

Fernanda Granja explicou à jornalista do Público que a solidão é um desterro.  É uma definição severa e tenebrosa. A Fernanda tem uma mercearia no Carvalhido mas parece uma especialista em Cioran a falar.

Punctum

Ao ler a notícia da retrospectiva integral do trabalho de Jean-Marie Straub e Danièle Huillet entre setembro e dezembro na Casa Manoel de Oliveira, os olhos fogem-me para o último parágrafo:  vai obrigar a uma revisão de toda a legendagem dos filmes .

Fechado para obras

Durante muito tempo, os livros da &etc foram impressos no Porto, na Coovaforme (Cooperativa Gráfica de Antero de Quental), que ficava perto de minha casa, no número 197 da Rua Antero de Quental. Quando a gráfica faliu, o espaço foi convertido numa pastelaria, que também vendia pão. Ou padaria, que também vendia bolos. A pastelaria fechou de repente há uns anos. O aviso mal-amanhado que colaram na porta, «Fechado para obras», está amarrotado, desbotado pelo sol e cagado das moscas. Nem livros, nem pão, nem bolos.

Livro

Nicole Brenez: Para além dos argumentos de  Les rendez-vous d'Anna (Albatros, 1978) ou Un divan à New York (L'Arche, 1996), publicaste dois livros: uma peça, Hall de nuit (L'arche, 1992), e uma espécie de monólogo, Une famille à Bruxelles (L'Arche, 1998).  Chantal Akerman: Por muitas razões, acredito mais em livros do que em imagens. A imagem é um ídolo num mundo idólatra. Num livro não há idolatria, mesmo que possas idolatrar as personagens. Acredito no livro; quando mergulhas num livro formidável, é como um acontecimento, um acontecimento extraordinário.  Nicole Brenez:  Que livros foram acontecimentos para ti?  Chantal Akerman: Isso era mais quando era nova. Nos últimos anos, Vida e Destino , de Vassili Grossman, publicado quinze anos depois dele morrer, foi um acontecimento. E os Contos de Kolimá , de Varlam Chalamov.  Nicole Brenez:  Duas histórias russas que documentam a guerra e os campos. Chantal Akerman:  Sim. É sempre isso. Chantal Akerman: A Entrevis

150 confessionários

Cada um dos participantes na Jornada Mundial da Juventude (JMJ), que decorre em Lisboa entre os dias 1 e 6 de Agosto, vai ter um local onde pode “encontrar a alegria de se sentir amado e perdoado”. Vai ser instalado na chamada “Cidade da Alegria”, chama-se “Parque do Perdão” e conta com 150 confessionários ao ar livre. (...) Em cada confessionário, e em diferentes idiomas, estará disponível um sacerdote “para acolher e escutar os jovens peregrinos, convidando-os a fazer a experiência do amor e da misericórdia de Deus através do sacramento da Reconciliação”, diz a organização da JMJ no seu site na Internet. “Tal como Maria se levantou para ir ao encontro de Isabel, o Parque do Perdão é este espaço de reencontro com Deus, com o próprio e com os outros. Um cais de partida para um coração novo, reconciliado com as suas feridas. A oportunidade de um reinício radical de uma História que só a força do perdão pode eternizar!”, acrescenta o texto de apresentação do Parque do Perdão. As inscriçõ

Há ursos lá fora

Os carros nos filmes iranianos.  São prisões. Mas prisões em movimento.  A paisagem a deslizar, do outro lado da janela, é a parte do filme que não é inteiramente acessível e que é preciso imaginar. Tal como um preso imagina o que se passa do outro lado da cela.  O personagem pode parar, sair do carro e caminhar um pouco pelo mundo. Mas não por muito tempo. É uma breve saída condicional. O personagem já não sabe onde pôr os pés. Há mil armadilhas.  Um dedo invisível aponta-lhe rapidamente o caminho de volta. Resta-lhe entrar no carro e arrancar.  O interior do carro é como o interior do crânio. É aí que tudo se passa: todas as manifestações da vida, especialmente o medo, o terror, e o seu fruto mais cruel e maduro, a paranóia.

Cem cigarros

Disseram-me que a minha irmã fumava cem cigarros por dia! Emil Cioran, Cadernos 1957-1972 (escrito em maio de 1967, seis meses depois da morte da sua irmã Virginia)

Barba e cabelo

Leio no jornal que o novo comandante militar russo na Ucrânia, Valeri Guerasimov, elegeu como uma das prioridades a higiene e a apresentação física dos soldados que combatem no terreno, incluindo o tamanho da barba e do cabelo. A sensação é a de que estamos a assistir a uma representação dos Últimos Dias da Humanidade , de Karl Kraus. Uma nova «leitura» ou «actualização», como se diz no teatro. E não é preciso «actualizar» demasiado.

Observações avulsas sobre matosinhos sul #52

Admirou qualquer coisa, esticou-se e morreu.

As lições de George Saunders sobre os contos russos que fazem parte do livro «Nadar num lago à chuva» são porreiras. Ele é um tipo cheio de ideias (não só literárias, sorte nossa) e consegue manter nas aulas um discurso que é aparentado aos seus contos, pelo menos tem o mesmo sentido de humor e outra coisa que não sei dizer bem o que é, mas que me atrai sempre e muito. Já estou na análise do último conto, «Aliocha, o Pote », de Lev Tolstói, e confesso que fiquei espantada por achar esta história a mais admirável de todas. Se tivesse que responder a um questionário prévio, nunca escolheria Tolstói como escritor (russo) preferido e mesmo depois de ler a pequena narrativa e apesar de me dar conta da sua extrema resistência (como se diz dos materiais) ao entendimento, ainda não sabia da sua importância. Mas as dúvidas que Saunders levanta obrigaram-me a reler e a investigar. Foi a ambiguidade que Tolstói reservou para o final da história e da vida de Aliocha que provocou todo este alvoro

Nomes

Na escolha de nomes, só há um grupo mais imaginativo do que os «criativos» da Polícia Judiciária: os empresários. Na Rua de Santos Pousada existe um Lar de Terceira Idade chamado «Pôr-do-sol».

Avançar para um maior grau de insegurança

Não me cabe a mim, querido amigo, emitir um juízo sobre um livro do qual sou objecto. Saiba, porém, que a sua tentativa de captar desde o interior a minha maneira de ver as coisas iluminou-me sobre numerosos detalhes, sobre numerosas ilusões surgidas do arrebatamento ou da negação e, deste modo, tornou-me um pouco mais exterior, um pouco mais estranho a mim mesmo, o que devia ser a ambição de quem se compromete nesta aventura de espectador que é o conhecimento de si mesmo. Tem razão ao deixar de lado as «influências». Sofri muitas porque, não tendo praticado nenhum ofício, pude, ao longo dos anos, ler um número considerável de autores. Quais citar? Todos aqueles — e são uma legião — que, de Theognis a Beckett, formularam as suas reservas à legitimidade da existência.  Não foram, no entanto, as leituras que me formaram, mas os acidentes e os encontros. Tudo o que descrevi é fruto de circunstâncias, de acasos, de conversas, de ruminações nocturnas, de crises de desânimo mais ou menos quo