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A mostrar mensagens com a etiqueta O Homem que matou Liberty Valance

Maldição dos mortos

O Andy Rector contou-me que numa das sessões da Cinemateca, Tag Gallagher perguntou ao público se sabiam porque é tão tremendamente triste e trágico o último plano de O homem que matou Liberty Valance . Ele próprio ainda não conseguiu encontrar uma resposta clara. Acrescentou que era como se estivéssemos no comboio da civilização, mas não era bem isso que queríamos . É fácil argumentar que todo o filme tem essa amargura porque nos mostra que a democracia americana é construída sobre actos não muito dignos. No entanto, acordei de noite e isto veio-me de novo à cabeça e tomou conta da insónia. A minha resposta incorria num erro básico de perspectiva: uma vez que tinha abordado o filme de um ponto de vista político, não via o resto. Mas o comentário de Tag conseguiu desinquietar-me e obrigou-me a repensar. Não se trata apenas daquele plano, creio, é todo um bloco que começa quando Stoddard fecha a porta do barraco transformado em câmara ardente e vê a flor de cacto sobre o caixão

«Vamos arrancar-vos o coração»

Sempre que volto a ver um filme de John Ford, fico presa. Já conheço as personagens, os actores, as paisagens — é tudo familiar e essa proximidade leva-me a perceber melhor as razões (ou contradições?) de cada um e a  profundidade de campo da história . No caso d’ O homem que matou Liberty Valance (1962) , há um traço que divide os territórios de Tom Doniphon e de Ransom Stoddard. Ambos desejam mais ou menos o mesmo, mas um acredita que a justiça é uma coisa pessoal que passa pela defesa armada rápida (ou ataque, se for caso disso) e o outro acredita na protecção da lei (e dos livros) para todos. Um representa o passado; e o outro, o futuro de uma república democrática fundada sobre uma Constituição cujo preâmbulo abre com as palavras «nós, o povo». Ora nem mais, o povo. O filme começa com Doniphon dentro de um caixão simples e barato, sem pistolas nem botas, um tipo que não tem onde cair morto está para ali à espera de voltar à terra a que sempre pertenceu. Stoddard, pelo contrário, é