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Liquidação

E ainda a propósito do sentido das palavras:

Somos feitos de palavras. São o nosso limite e ilimite. Ético. Estético. Político. Com elas nos exprimimos, atrás delas nos escondemos. São mentira reveladora, verdade tímida, meia verdade. Carregam a nossa impotência e embriagam-nos com o seu poder.
Apesar da omnipresença das imagens, as palavras passaram a ser o suporte mais forte da pós-verdade. A par das fake news, que inundam a cena política, o recurso ao fake knowledge, amiúde assente no name dropping, tem vindo a vulgarizar-se a ponto de haver quem defenda, com falsa candura, que tudo é o que é e o seu contrário. Só assim se explica que proibir pretensamente signifique permitir que alguém se coíba...
(...)
Repare-se, por exemplo, na utilização pelos programadores dos Teatros Municipais do termo “ocupar” (1000 razões de ocupar o teatro) que, remetendo para factos ocorridos num passado assaz recente – a saber: a luta contra a privatização da gestão do Rivoli –, aposta no seu total esvaziamento (e, por extensão, do sentido da luta). Atente-se na reescrita do mundo que ocorre quando a propósito da expulsão de uma inquilina por meio dum incêndio, Tiago Guedes reprova o adjectivo “criminoso” usado para qualificar esse tipo de despejo, de que no Porto houve infeliz exemplo... As palavras desvendam ou camuflam.

Regina Guimarães, hoje no Público.

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