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É a vida

1.
Dans un village de Normandie, un enterrement. Je demande à un paysan des précisions. « Il était jeune, à peine soixante ans. On l’a trouvé mort dans les champs. Que voulez-vous ? C’est comme ça. » Et de répéter plusieurs fois : « C’est comme ça. » Qu’aurait-il pu dire d’autre ? Que peut-on dire d’autre sur la mort ? « C’est comme ça, c’est comme ça. » L’irréparable rend stupide. (Emil Cioran, Cadernos 1957-1972)


2.
A tradução mais literal é esta, quase palavra por palavra — como deve ser:

Numa aldeia da Normandia, um enterro. Peço pormenores a um camponês. “Era jovem, apenas sessenta anos. Foi encontrado morto no campo. Que quer? É assim.” E repete várias vezes: “É assim.” Que mais poderia dizer? Que mais podemos dizer sobre a morte? “É assim, é assim.” O irreparável faz-nos estúpidos.


3.
Pois, está muito bem, mas apetece estragar um bocado; apetece traduzir “c’est comme ça” por “é a vida”. Argumentos não faltam: a expressão é muito vulgar, transmite melhor o sentido de inevitabilidade (é afim do gesto, tão humano, de encolher os ombros), dá origem a um paradoxo, e até um pouco de humor involuntário — e tudo isto vai muito bem com Cioran:

Numa aldeia da Normandia, um enterro. Peço pormenores a um camponês. “Era jovem, apenas sessenta anos. Foi encontrado morto no campo. Que quer? É a vida.” E repete várias vezes: “É a vida.” Que mais poderia dizer? Que mais podemos dizer sobre a morte? “É a vida, é a vida.” O irreparável faz-nos estúpidos.

Comentários

Luis Eme disse…
Fez bem em estragar. Há coisas que existem para ser "estragadas", aliás, melhoradas.
Joana disse…
;))))) Estas reflexões são preciosas.