Já lá vai uma geração desde o colapso do Muro de Berlim. Nas décadas de 1960 e 1970, o capitalismo teve de se confrontar com o problema de como controlar e absorver as energias vindas do exterior. Hoje em dia, o capitalismo depara, aliás, com o problema oposto; tendo incorporado com demasiado sucesso a externalidade, como poderá funcionar sem um exterior que possa colonizar e do qual possa apropriar-se. (...) Veja-se, por exemplo, o estabelecimento de zonas culturais «alternativas» ou «independentes» estáveis, que repetem infindavelmente gestos mais antigos de rebelião e contestação como se pela primeira vez. «Alternativo» e «independente» não designam algo exterior à cultura dominante; ao invés, são estilos, os verdadeiros estilos principais, aliás, no seio da cultura dominante.
de Cristina Fernandes e Rui Manuel Amaral
Comentários
Tendemos a perceber o imperialismo/colonialismo como instituições passadas pertencentes exclusivamente aos livros didáticos de História, mas na realidade persistem mais vivos do que nunca na máscara da liberdade e reverência aos "estilos de vida", sejam eles alternativos ou tradicionais (muito do surgimento da "nova direita" se deve por conta desta apropriação capitalista, já vaticinada por John Gray, ainda nos inícios dos anos 2000, no livro "Cachorros de Palha", onde ele dizia que incorporar "posturas conservadoras" seria uma nova forma de transgressão num futuro onde o establishment insistiria cada vez mais num posicionamento progressista).
O primeiro estágio do imperialismo foi a conquista de territórios (a "externalidade" da qual fala Fischer), o segundo é está absorção de "estilos de vida" (pretensamente interior, mas limitado em levantar slogans genéricos e vazios: "seja você mesmo!" ou "você pode ser tudo que quiser!").