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Nós somos de confiança

- Então, Armando, conta lá, o que é que estás a escrever agora?
A temida pergunta acabou por chegar. Já tinham terminado a refeição e encontravam-se na sala de estar da residência barranquina, a tomar café. Pela janela entreaberta via-se o farol do molhe e a névoa invernal, que subia das falésias.
- Não te faças desentendido - insistiu Óscar. - Já sei que os escritores às vezes não gostam de falar do que estão a fazer. Mas nós somos de confiança. Dá-nos essa primazia.
Armando pigarreou, olhou para Berta como que dando a entender que os amigos estavam a ser inoportunos, mas, acendendo o cigarro, decidiu-se finalmente a responder.
- Estou a escrever um conto sobre a infidelidade. O tema não é muito original, como sabem. Já se escreveu tanto sobre a infidelidade! O Vermelho e o Negro, por exemplo, ou Madame Bovary e Anna Karénina, para citar apenas duas obras-primas... Mas eu sinto-me atraído justamente pelo que não é original, pelo vulgar, pelo já trilhado... A este respeito, interpretei à minha maneira uma frase de Claude Monet: O tema é indiferente, o importante são as relações entre o tema e o escritor... 

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