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Nestbeschmutzer

Sempre pensei que nenhum escritor pudesse usar o método (exuberante? exagerado?) de Thomas Bernhard. O que ele faz com as palavras é tão difícil e extraordinário que sempre pensei que ninguém se atreveria e seguir esse caminho tortuoso. Além disso, a torrente musical do seu discurso ininterrupto não é bem da escrita que emerge e só um escritor que não seja escritor, ou melhor, só um escritor que lute contra a escrita e contra tudo, só um verdadeiro Nestbeschmutzer (não devia ser Nestzerstörer?) consegue lá chegar. Foi por isso com muita estranheza que encontrei vestígios do tom bernhardiano em «Pudor e Dignidade». Dag Solstad até consegue estabelecer uma relação interessante com O Pato Selvagem de Ibsen. Quando, a meio de uma vulgar aula de literatura a uma turma do secundário, Elias Rukla descobre a importância e o verdadeiro papel do médico Relling, está longe de se aperceber que ele próprio é uma personagem secundária e está no centro de um livro sobre uma personagem secundária. Nesta acrobacia, Dag Solstad sai-se bastante bem. O pior é quando tenta que o seu discurso narrativo tenha uma intensidade e cadência bernhardiana. Usa as regras da escrita quando precisava de usar as regras do contraponto. Usa a mestria do ofício quando precisava de se deixar levar por um desvario total, um delírio autodestrutivo que avançasse implacavelmente para uma ideia fixa e demolidora.

 
É um bocado injusto, mas na verdade também é muito difícil dar uma hipótese a Dag Solstad depois de termos lido os livros de Thomas Bernhard, depois de nos termos rendido a Thomas Bernhard.

Comentários

Bo atarde disse…
« Vous souvenez-vous de certains modèles que vous avez pu avoir ? » « Tout cela est un peu flou. Charles Péguy et d’autres auteurs du même genre, voilà ce qui m’a intéressé très tôt, plutôt les auteurs français chrétiens révolutionnaires. » (Bernhard)
Contra as eleições, não deve haver autor melhor do que o Péguy
c disse…
Quase não conheço, só algumas citações em filmes.

Mas estou a passar os olhos por «Clio — Dialogue de l'histoire et de l'âme païenne» e, se tivesse tempo, gostava de o traduzir.

Talvez um dia...
Boa noite disse…
Prometo que o vou traduzir antes de você!

Do Péguy está quase tudo aqui http://www.charlespeguy.fr/cahiers
O Clio justamente não está (junto com outros) porque não foi publicado nos cahiers
c disse…
Força!

Obrigada pelo link.

O texto da Clio, encontrei-o na BNF: https://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k96062336
Boa noite disse…
sim, a Clio, com a voz da Miéville (não só no Histoire(s), também no Rapport Darty) (infelizmente muitos não sabem que Clio tem a voz da Anne-Marie), dizendo: Voyez-vous Péguy...

Infelizmente muitos não sabem que a Clio do Péguy é a mesma Clio do Jean-Luc: a revolução que não ocorreu. Le soir tombe. Les vacances finissent. Nada aconteceu.