O sentimento de que corre tudo mal existiu em todas as épocas, e com razão, já que o maior prazer do homem é inventar maneiras de tornar a vida uns dos outros miserável. A afirmação dos conservadores de que a sociedade actual é má, mas a seguinte será ainda pior, é irritante e até mesmo insuportável. E, no entanto, a história confirma este diagnóstico à risca. Que fazer? Tornar-se budista ou aceitar o Progresso de olhos fechados? Esta superstição vem do tempo do Marquês de Condorcet, e a sua influência tem sido enorme. A ideia de Progresso é uma forma atenuada de utopismo, um delírio aparentemente razoável sem o qual as ideologias do século passado, assim como as do nosso, teriam sido impossíveis. A originalidade do ponto de viragem histórico que estamos a testemunhar reside no facto de este delírio estar a ser contestado, submetido a uma lucidez fatal — um despertar ao mesmo tempo libertador e terrível. As velhas categorias de «direita» e de «esquerda» parecem ultrapassadas. Evidentemente, ainda podemos usá-las de vez em quando, mas no fundo elas não fazem senão fugir ao essencial. Porquê aderir a ilusões a ponto de as proclamar, de as incorporar no núcleo de uma doutrina?
Hoje em dia já ninguém acredita verdadeiramente no futuro — quero dizer, ninguém que seja normal. Os lunáticos, sim. O optimismo de Hegel ou de Auguste Comte parece ultrapassado e inconcebível. Mencionei Hegel porque ele atribuiu à História um estatuto extraordinário e justificou de antemão todas as tentativas de gigantismo ideológico. Depois, porém, o seu sistema não foi nem de perto nem de longe tão inspirador como a sua megalomania. Foi Hegel quem deu o exemplo para pensar em grande — e foi assim que Marx triunfou e falhou, ou há-de falhar. Se a História tem algum sentido, só pode ser o de invalidar as visões monumentais que a tentaram interpretar, reconfigurar ou remodelar…
A ideia de catástrofe é talvez menos importante do que a de impasse. Porque esse é o futuro da história: uma procissão de impasses, uma sucessão de becos sem saída, uma imobilidade em movimento — e é por isso que as pessoas sempre sentiram que estava a correr tudo mal. A história, tal como a vida em geral, desenrola-se, mas não progride. Será razoável dizer: estou a progredir para a velhice? Estou a progredir para a morte? Avança-se nessa direcção e mais nada. E o mesmo se passa com a história universal e até com o Espírito Absoluto de Hegel.
«O sentimento de que corre tudo mal», Emil Cioran.
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