Era uma vez um autor que não queria ser autor. No entanto, a mão insistia em escrever. E escrevia, escrevia mesmo contra a vontade dele. Onde tinha ido a mão buscar esse vício é o que lhes pergunto. A verdade é que tudo pode suceder neste mundo. (Esta crónica já vai longa e maçuda, e ainda há bastante por dizer.)
Entretanto uma história avançava no papel. Mas também a história não queria avançar, não queria sequer ter começado. Os personagens, os vivos e os mortos, estavam igualmente irritados porque não queriam ser personagens. Na verdade, não compreendiam como tinham ido ali parar. Ah!, aquilo era demais, era fazer pouco.
As palavras estavam presas às frases e as frases estavam presas ao papel, e todas se debatiam furiosamente, tentando libertar-se daquela misteriosa força que as detinha ali. O papel também participava, contrariado, em tudo aquilo. Esta cena, a todos os títulos lamentável e confrangedora, levaria a própria paciência a perder a cabeça. Que era lá aquilo? Que é que se passava? (É preciso ter guelras para aguentar tamanho disparate.)
Seguiu-se então uma rixa violenta entre o autor, a mão, os personagens, as palavras e o papel: guinchos, pontapés, bofetadas, arranhões, cadeiras caídas, garrafas, copos, pratos partidos, o vinho entornado na toalha, uma barafunda infernal. E passo por cima de outras extravagâncias que, por razões do mais básico decoro, me dispenso de relatar.
Depois, num instante, tudo acabou. E o autor pôde finalmente sair e apanhar o autocarro.
Publicado no Porto24, página dos Cronistas do Bairro.
Entretanto uma história avançava no papel. Mas também a história não queria avançar, não queria sequer ter começado. Os personagens, os vivos e os mortos, estavam igualmente irritados porque não queriam ser personagens. Na verdade, não compreendiam como tinham ido ali parar. Ah!, aquilo era demais, era fazer pouco.
As palavras estavam presas às frases e as frases estavam presas ao papel, e todas se debatiam furiosamente, tentando libertar-se daquela misteriosa força que as detinha ali. O papel também participava, contrariado, em tudo aquilo. Esta cena, a todos os títulos lamentável e confrangedora, levaria a própria paciência a perder a cabeça. Que era lá aquilo? Que é que se passava? (É preciso ter guelras para aguentar tamanho disparate.)
Seguiu-se então uma rixa violenta entre o autor, a mão, os personagens, as palavras e o papel: guinchos, pontapés, bofetadas, arranhões, cadeiras caídas, garrafas, copos, pratos partidos, o vinho entornado na toalha, uma barafunda infernal. E passo por cima de outras extravagâncias que, por razões do mais básico decoro, me dispenso de relatar.
Depois, num instante, tudo acabou. E o autor pôde finalmente sair e apanhar o autocarro.
Publicado no Porto24, página dos Cronistas do Bairro.
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