Como eu gostava de ser cavalo...  Bastava que, ao olhar para o espelho, pudesse ver, em vez de pés e mãos, cascos e uma cauda no traseiro e uma cabeça de cavalo autêntica, para ir direito ao departamento de habitação...  «Quero um andar grande e moderno», diria.  «Tem de preencher uma requisição e esperar a sua vez.»  «Ah, ah, ah», havia de rir. «O cavalheiro não vê que não sou nenhum vulgar homem da rua? Sou diferente, sou especial.»  Logo a seguir, dar-me-iam um grande e espaçoso andar com casa de banho.  Faria espectáculos numa revista e ninguém se atreveria a dizer que não tinha talento - mesmo se o texto não prestasse. Pelo contrário, haviam de elogiar-me.  «Não é uma maravilha, para um cavalo?», diriam.  «Que cabeça!», comentariam outros.  Depois viria todo o gozo dos ditados e provérbios: «Senso de cavalo», «A cavalo dado não se olha o dente», «Um reino para um cavalo», «Um cavalo cinzento»...  Havia de despertar o interesse das mulheres. «Você é tão diferente», diriam.  E, quan...