(...) Já o trilho começava a subir e já a noite começava a cair. Simão pegou de novo no bandolim, que manejava como um feiticeiro. A história senta-se de novo numa pedra atrás dele e escuta com grande assombro. É uma tarefa cansativa, esta de contar histórias. Sempre a correr atrás de um rapazote romântico, pernalta e bandolineiro, e sempre à escuta de tudo o que ele canta, pensa, sente e diz. E o diabo do pajem não pára quieto, e nós temos de ir sempre atrás dele como se fôssemos na verdade o pajem do pajem. Ouve um pouco mais, paciente leitor, se tens ainda ouvidos, pois dentro em breve diferentes personagens prestarão as suas mais submissas reverências. As coisas animam-se. Surge um palácio; achado para um pajem à procura de castelos em ruínas. Mostra agora a tua arte, filho, senão estás perdido. E ele mostra. Canta para a donzela que se dá a ver na varanda do primeiro andar com voz tão doce, tão mentirosa, que o coração dela necessariamente se comove. Temos penedos, pinheiros e pajens, pajens não, um pajem apenas, sim, o nosso Simão que neste momento reúne na sua rica figura, acima descrita, todos os graciosos pajens do mundo inteiro. Temos canções e música de bandolim, temos a doçura que o rapaz sabe esconjurar do seu instrumento
e temos o que em circunstância alguma poderia faltar, uma meiga donzela vestida de branco, que envia um sorriso para baixo e com a mão chama para cima. A canção conquistou um lugar no coração dela, porque é uma canção tão simples e doce e bonita. (...)
Do filme “Ele, o chapéu, assenta nela, a cabeça - Histórias de Robert Walser” de Walo Deuber, tradução de Isabel Castro Silva
Do filme “Ele, o chapéu, assenta nela, a cabeça - Histórias de Robert Walser” de Walo Deuber, tradução de Isabel Castro Silva
Comentários