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Flannery O’Connor e as galinhas

Take one
Quando tinha seis anos tive uma galinha que andava para trás e apareceu na Pathé News. Eu aparecia junto com a galinha. Estava ali apenas para ajudar a galinha mas foi o ponto alto da minha vida. Desde então tem sido tudo anti-clímax.

Take two
Quando tinha cinco anos, tive uma experiência que me marcou para toda a vida. A Pathé News enviou um fotógrafo de Nova Iorque a Savannah para tirar uma fotografia a uma das minhas galinhas. Essa galinha, uma Cochin Buff Bantam, distinguia-se porque conseguia andar para a frente e para trás. A sua fama espalhou-se pela imprensa, quando chamou a atenção da Pathé News suponho que já não havia mais nenhum sítio para onde ela pudesse ir — nem para a frente nem para trás. Pouco depois morreu, como agora parece apropriado.
A partir desse dia com o homem da Pathé, comecei a colecionar galinhas. O que tinha sido apenas um interesse moderado tornou-se uma paixão, uma demanda. Preferia as que tinham um olho verde e outro laranja, ou com pescoços demasiado longos e cristas tortas. Queria uma com três pernas ou três asas, mas não apareceu nenhuma desse tipo.
Refleti sobre uma imagem do livro de Robert Ripley “Acredite ou não” que mostrava um galo que sobreviveu 30 dias sem a cabeça, mas eu não tinha temperamento científico. Podia sempre costurar por isso comecei a fazer roupa para as galinhas. Uma Bantam cinzenta chamada Coronel Eggbert usava um casaco de piqué branco com gola de renda e dois botões nas costas. Aparentemente a Pathé News nunca ouviu falar destas galinhas; não enviou outro fotógrafo.

Take three
A pequena Mary (Flannery) O’Connor e a sua galinha amestrada.


Comentários

Joana disse…
Eu bem tentei que o Mood and Manners fosse publicado cá. Traduzi-o a fundo perdido, mas ninguém lhe pegou.
c disse…
Queres dizer “Mystery and Manners”, não é? É pena, eu gostava de ler.

Este texto (o take two) é de lá (de “O rei dos pássaros”).

Só conheço algumas passagens e também algumas cartas (de “The habit of being”). Gosto desta escrita descontraída.
Joana disse…
Mystery and Manners, exactamente! Não me apercebi do lapso. As cartas não conheço tão bem, mas parece-me que a acutilância é a mesma,