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Uma vida sem narrativa

Os filmes de Hong Song-soo são, muitas vezes, sequências de fragmentos desgarrados no tempo e com poucas explicações — e está bem assim, não precisamos de nos preocupar com o desenvolvimento da história; o que for, será. 

Em Apresentação este método é tão intenso que parece que estamos a ver um exercício de filmagem ou até mesmo restos, filme perdido. A representação excessiva do velho actor com alguns fotogramas desfocados; os enquadramentos dos actores quase sempre de perfil ou mostrando os pés e as pernas, as calças curtas; os abraços tímidos mas prolongados; o rapaz a entrar na água fria — tudo isso ajuda a reforçar essa ideia de improvisos desajeitados, material que seria deitado ao lixo da mesa de montagem.

Mas a justificação maior acontece do lado de fora; creio que é por esse carácter de película sem interesse nem significado se assemelhar tanto à nossa vida que aderimos tão profundamente aos filmes de Hong Song-soo. A precariedade na tela é uma interpretação da nossa precariedade existencial — não por comparação mas por afinidade. 

Assim, apetece traduzir o título de outra forma: introdução, iniciação ou até mesmo preâmbulo. E, correndo o risco de exagerar na tarefa, talvez colar um pedaço de película preta no fim?



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