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O Fausto de Meyrink

«Tirando as lunetas, viu diante de si um homem nu, que só trazia uma pele de animal em torno dos rins; uma personagem de alta estatura, de pele morena, espantosamente magro, que tinha colocada na cabeça uma mitra negra, sobre a qual se acendiam partículas de ouro.
O médico da Corte percebeu imediatamente que se tratava de Lúcifer, mas não se sentiu nada surpreendido, porquanto, intimamente, havia já muito tempo que esperava por aquela aparição.
- Tu és o homem que pode realizar todos os desejos? - perguntou-lhe, inclinando-se voluntariamente. - Podes também...?
- Sim, eu sou o deus em cujas mãos os homens entregam os seus desejos - interrompeu o fantasma, indicando a pele que lhe cingia os rins. - Entre todos os deuses, sou o único que usa cinto: os outros são assexuados.
Só eu posso compreender os desejos. Aquele que é verdadeiramente assexuado esqueceu para sempre o que são desejos. A mais profunda raiz de todo o desejo, seja ele qual for, raiz impossível de descobrir, repousa sempre no sexo, mesmo quando a flor - o desejo em estado de vigília - não tem aparentemente nada a ver com a sexualidade.
Eu sou o único deus misericordioso. Não há súplica que eu não ouça e não realize de imediato.»

Gustav Meyrink, A noite de Walpurgis. Tradução de Maria Teresa Antunes Cardoso.

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