A ambiguidade é um grande trunfo de Jeanne Dielman . Podemos levar o filme para onde quisermos, ele segue-nos, obedientemente ou com relutância, mas depois volta à sua forma original — intacto, pronto para outro devaneio. Podemos andar nisto muito tempo. Hoje de manhã, à revelia de Chantal, durante a viagem de metro ocorreu-me que os dois últimos planos podem ser uma imagem do que se passa na cabeça de Jeanne. Nesta versão, o crime e a pausa depois do crime não são executados, são apenas idealizados ou talvez seja melhor dizer: potencializados . Claro que isso mostra-nos uma personagem ainda mais perturbada porque acumula ideias revolucionárias num sítio obscuro da sua cabeça — uma mulher que não mata aquele homem mas é capaz de incendiar o mundo inteiro amanhã.
de Cristina Fernandes e Rui Manuel Amaral