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Brodski contrariava uma qualquer norma extremamente importante

(...)
Brodski criou um modelo inédito de comportamento. Não vivia num estado proletário, mas num mosteiro do seu próprio espírito.
Não lutava contra o regime. Simplesmente não dava por ele. E mal sabia da sua existência.
A sua falta de conhecimento da vida soviética parecia fingida. Por exemplo, andava convencido de que Dzerjinski estava vivo. E que Komintern era o nome de um grupo musical.
Não reconhecia os membros do Politburo do Comité Central. Quando, na fachada do seu prédio, afixaram um retrato de seis metros de Mjavanadze, Brodski disse:
— Quem é este? Faz lembrar William Blake...
O comportamento de Brodski contrariava uma qualquer norma extremamente importante. E foi desterrado para a região de Arkhangelsk.
O poder soviético é uma dama melindrosa. Quem a ofende, sofre. E é pior ainda para quem a ignora...

Serguei Dovlatov, O Ofício. ANTÍGONA. Outubro 2018. Páginas 42 e 43.

Comentários

Uma outra forma de resistência.
c disse…
Sim. O livro é sobre isso mesmo: como resistir a um sistema opressor, como resistir à estupidez.

Cada um desenvolve o seu método: Brodski mais abstracto, Dovlatov muito concreto e muito irónico, outros fazendo cedências. Todos bebem muito.
São a dos meus. A parte do beber, claro. Quanto ao resto: faço o que posso.
Adenda: considero todos os sistemas, por natureza, opressores.
c disse…
Aceito a afirmação se pensarmos na imagem das margens do rio — num sentido muito lato, muito brechtiano. Por natureza, como dizes, todos os sistemas são opressores.

Em termos políticos, já não é bem assim. A democracia, com todas as suas fragilidades e defeitos, está muito distante do sistema comunista soviético — é bom não esquecer essa escala, não meter tudo no mesmo saco, senão perde-se a perspectiva.