Nunca devemos responder a cartas de desconhecidos. Quando as recebia, agora compreendo, era porque falavam de mim na «imprensa». Como já não publico e depois de uma certa «conspiração de silêncio» (!), mais ninguém repara na minha existência. Facto com que me congratulo. Mas que lição! E pensar que, como toda a gente, acreditei nos «admiradores»! (Outubro de 1962) Acho que não recebi uma única carta de um desconhecido que fosse normal. De um desconhecido, entenda-se, que me tenha escrito entusiasmado, a quem dei alguma coisa e que confessou sentir afinidades comigo. Destroços, perdidos, infelizes, doentes, dilacerados, incapazes de inocência, corroídos, atingidos por todos os tipos de enfermidades secretas, falharam em todos os exames cá em baixo, arrastando atrás de si o seu jovem ou o seu velhíssimo desconcerto. Nunca me pediram nada, porque sabiam que nada lhes podia oferecer. Só queriam dizer que me tinham compreendido... (Novembro 1968) Emil Cioran, Cadernos 1957-1972.